«Acuso a RTP» (carta ao Provedor)

«um povo corrompido que atinge a liberdade tem a maior dificuldade em mantê-la».
Maquiavel (in Jorge de Sena, 40 Anos de Servidão)

No exercício dos meus direitos/deveres de cidadã, repudio e condeno energicamente a precipitação da RTP na aplicação do novo Acordo Ortográfico, considerando que esta iniciativa viola o seu “Código de Ética e de Conduta”, que estipula: “(…) à RTP, enquanto concessionária dos serviços públicos de rádio e de televisão, estão cometidas especiais obrigações que vão muito além de uma dimensão jurídica: a sua actuação deve estar, também, enquadrada numa dimensão ética e comportamental irrepreensível”; e falando da sua “missão” acrescenta: “O serviço público de media (…), prestado pela RTP deve constituir uma referência para a população (…)”.

Esta antecipação da RTP, relativamente à entrada em aplicação do Acordo na Administração central, que o governo decidiu para Janeiro de 2012, colide a meu ver com o sentido das responsabilidades que deveria ser o seu, dada a abrangência e influência universal de que é detentora. A imagem que assim passa para o mundo não credibiliza a nossa língua.

Acuso também a RTP de não ter promovido o debate e a informação independente e plural imprescindíveis no tratamento de uma questão que põe em causa a nossa mais genuína e profunda identidade e nos diz a todos respeito. A nossa língua – português europeu – não é feudo dos políticos nem dos interesses económicos, é do povo português, que tem uma longa e antiga História que o honra e que convém não esquecer.

Acuso portanto a RTP de cumplicidade no silêncio, na opacidade, na pressa e na prepotência que tem rodeado a imposição deste Acordo, inúmeras vezes denunciado pela comunidade científica como desnecessário, inútil, perigoso e desprestigiante.

Lamento ainda que tanto dinheiro público se tenha de repente encontrado para financiar a promoção do Acordo de 1990, quando o Estado nunca teve meios nem a vontade política necessária para promover a investigação, o ensino e a difusão da nossa língua, no país, junto dos emigrantes e luso-descendentes e no estrangeiro.

Termino citando o prefácio ao “Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea”, da Academia das Ciências de Lisboa, Ed. Verbo, 2001, que só o apoio da Fundação Gulbenkian tornou possível:
“A Academia das Ciências de Lisboa deve ser talvez, de todas as suas homólogas europeias fundadas no século XVIII, uma das poucas que, na sua já longa existência de 222 anos, não conseguiu publicar um dicionário completo do seu próprio idioma.”
(José Vitorino de Pina Martins, Presidente da Academia das Ciências, 15/12/2000)

Texto da mensagem enviada, em 17/01/2011, para o Provedor do Telespectador e para o Provedor do Ouvinte, através do formulário de contacto por e-mail inserido no sítio da RTP – Maria José Abranches G. S.

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Retirar contaCto [Maria José Abranches]

Assunto: Retirar Contacto

Ex.mos Senhores,

Não desejo receber nada que aplique o novo Acordo Ortográfico, que considero um atentado à nossa identidade nacional no que ela tem de mais genuíno: a nossa língua. E a nossa língua é o português europeu, que não necessita deste Acordo para nada.

Contrariamente ao que alguns vão dizendo por aí, o novo Acordo não representa evolução nenhuma, antes significa um retrocesso, já que é, no essencial, um decalque da ortografia brasileira de 1943, particularmente no que toca às chamadas consoantes mudas. Convém relembrar, a propósito, que o Anexo II do Acordo de 1990 diz, acerca da unificação proposta pelo Acordo Luso-Brasileiro de 1945 – que nós e os outros seis países lusófonos até agora temos respeitado e que o Brasil decidiu não aplicar – que “assentava em dois princípios que se revelaram inaceitáveis para os brasileiros:
a) Conservação das chamadas consoantes mudas ou não articuladas, o que correspondia a uma verdadeira restauração destas consoantes no Brasil, uma vez que elas tinham há muito sido abolidas; (…) ”

O Brasil aboliu unilateralmente as ditas consoantes, porque não precisava delas para nada: por ser um país jovem que não se queria atrapalhar com a história da língua, a etimologia, ou as afinidades com as outras línguas românicas, bastando-lhe a transcrição fonética em termos de ortografia; por pronunciar como abertas todas as vogais átonas, contrariamente ao português europeu, o que é aliás uma característica arcaica do português do Brasil; por entender, o que é normal, dado tratar-se de um país resultante da independência de uma colónia, que devia seguir o seu caminho sem dar satisfações ao país colonizador.

Não contesto o direito do Brasil a fazer as opções que entender e até a desejar espalhar o seu domínio de país “emergente”, cheio de riquezas e potencialidades, a todo o universo da língua portuguesa que nós, pequeno país europeu, espalhámos pelos vários continentes. Mas entendo que os portugueses deveriam também considerar “inaceitável” este Acordo, que desfigura a nossa língua, lhe retira significado, inteligibilidade e história, a afasta das outras línguas românicas, acarretará alterações da nossa pronúncia e vai contribuir para a desintegração da própria tessitura sintáctica e vocabular, dado que os menos instruídos deixarão de distinguir na escrita as duas normas.

Muito mais poderia dizer porque tenho estudado esta questão a fundo, mas deixo um último argumento: não sejamos ridículos!

Aliás, a nossa magnífica política de língua, com a sua ambição de “internacionalização”, já está a dar os seus frutos: que grande escola francesa pode estar interessada em promover uma língua que anda agora a aprender a escrever (!) e que o Estado considera não ser importante ensinar como língua materna aos nossos emigrantes e luso-descendentes?

Todos temos responsabilidades nesta matéria e uma editora não pode furtar-se a assumir as suas. Não é com Acordos ortográficos que se promove uma língua, é com equipas de investigadores que sobre ela reflictam, que produzam dicionários, gramáticas, métodos, manuais, etc. Não há em Portugal um único dicionário comparável ao “Petit Robert”, a que recorro frequentemente quando procuro, para palavras portuguesas, uma explicação mais aprofundada e mais completa, a começar pela etimologia.

As nossas editoras apressaram-se a lançar no mercado “os mesmos” dicionários, com aplicação do Acordo… Progredimos muito em matéria de conhecimento da nossa língua, diversificação e desenvolvimento de obras de fundo para consulta corrente, não há dúvida…

É provável que não atendam ao que acabo de expor, mas cumpri o meu dever para comigo mesma e para com a língua, a cultura e a História que os meus antepassados me legaram e pelas quais devo zelar, para as transmitir em bom estado aos vindouros.

Com os meus cumprimentos e votos de um 2011 feliz,

Maria José Abranches G. S.

(Prof.ª aposentada do Ensino Secundário – Português e Francês; ex-Leitora na Universidade de Paris III)

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Macaqueação

«pelo menos tentou falar meio brasileiro, chega no brasil e se arma em gringo pa tu ve o que acontece 😉» Misheul
Comentário ao vídeo no YouTube.

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Anúncios #AO90

anúncio publicado no DN de 09.01.11Anúncio publicado no Diário de Notícias de 09.01.11.
anúncio publicado no JN de 09.01.11Anúncio publicado no Jornal de Notícias de 09.01.11.

Além dos anúncios pagos, como estes, também se pode publicitar a iniciativa através de sites grátis como, por exemplo, estes outros:

http://classificados.esquillo.com/detail.php?siteid=143604

http://lisboacity.olx.pt/iniciativa-legislativa-de-cidadaos-contra-o-acordo-ortografico-iid-154341453

http://classificados.destak.pt/anuncios/diversos/detalhe.php?cls_id=18858&referer=/account/%3FCLS_ADD%3DOK%26type%3D4

Os dois anúncios, publicados em simultâneo no DN e no JN (e com um “bónus” online incluído no preço), ficou por 33,74 € no total.

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O sobreiro vive

[novo prazo de entrega (final): 25 de Abril]

manuscrito


Terminou no passado dia 31 de Dezembro de 2010 o prazo para a recepção de subscrições da nossa ILC.

É verdade que, infelizmente, não atingimos as 35.000 assinaturas necessárias para apresentar no Parlamento o Projecto de Lei de suspensão da entrada em vigor do “acordo ortográfico”.

Mas é verdade também que muita gente ainda não desistiu, apesar de tudo; continuamos a receber não apenas assinaturas individuais como listas de recolha e, o que é mais importante e significativo, sucedem-se os apelos para que a iniciativa continue.

Pois bem, há que decidir.

Ainda valerá a pena continuar? Ainda poderemos ter sucesso? Seremos ainda capazes de travar o passo ao monstro “ortográfico”?

Respondamos então de forma clara e decidida: respectivamente, sim, sim e sim!

Ou, vendo a questão de outra forma, por exclusão de partes.

Existe alguma alternativa para acabar com aquele horror além da Iniciativa Legislativa de Cidadãos? Não, não há.

Podemos renunciar agora à luta quando tanta gente continua ainda a lutar, recusando o AO90, contestando a sua criminosa e traiçoeira entrada em vigor, escrevendo contra ele, publicando textos e estudos que denunciam o seu carácter desconchavado, inútil, desnecessário e, em suma, absurdo?

Pois não, não mesmo, é claro que não podemos renunciar à luta.

Podemos desiludir as expectativas, a esperança e a confiança de tantas voluntárias e voluntários que tão corajosamente continuam a denunciar e a combater este crime de lesa-cultura, recolhendo assinaturas e divulgando a iniciativa?

Não, não podemos, evidentemente, desiludir essa gente valorosa que é a nossa, que somos nós. Temos de continuar, dê lá por onde der e custe o que custar.

Ao fim e ao cabo, nós somos como aqueles activistas que se acorrentam voluntária e decididamente a um sobreiro milenar marcado para abate. E o nosso sobreiro milenar, aquele que alguns pretendem abater gratuita e miseravelmente, é nada mais nada menos do que a nossa língua-mãe, o Português, esse ser vivo antiquíssimo, com o seu tronco gigantesco, de casca rugosa e cheia de antigas e veneráveis cicatrizes; não permitiremos nem que o serrem pela base, separando-o da raiz como quem separa um corpo da sua cabeça, nem que lhe decepem os oito braços grandes, enormes, tão imponentes como os oito países que representam.

Aqui estamos e ficaremos, portanto, inamovíveis e determinados, lutando até ao limite das nossas forças por aquilo que é de todos e de que apenas uns poucos pretendem abrir mão.

Em suma, quer isto dizer que o prazo para recepção das subscrições da ILC contra o AO90 prolonga-se até ao próximo dia 25 de Abril. Se, quando chegados a essa data simbólica, realmente tivermos de concluir que mesmo assim não foi suficiente o empenho e a dedicação de tantos Portugueses a uma causa de todos eles, então poderemos nós outros ficar de consciência tranquila: fez-se tudo aquilo que era humanamente possível.

Veremos, então.

Para já, hoje por amanhã, o sobreiro vive e continua a sua luta para seguir vivendo.

[novo prazo de entrega (final): 25 de Abril]

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