Resistir à imposição do AO e insistir na ILC

A sabedoria implica forçosamente humildade e diálogo, características que contrariam a imposição do Acordo Ortográfico de 1990, igualmente ferido de falta de cientificidade e de argumentação linguisticamente consistente. Com efeito, logo desde o início se pretendeu vincar, perante quem se opunha ao referido AO, que toda a contestação, exigindo a sua suspensão ou a sua revogabilidade, seria vã. Estratégia reveladora da decisão político-diplomática previamente definida, não admitindo, pois, colisões. Assim, compreende-se a indiferença e a arrogância intelectual perante os pareceres profundamente críticos da Associação Portuguesa de Linguística e da Direcção-Geral dos Ensinos Básico e Secundário. Situação idêntica relativamente ao relatório elaborado pela Comissão de Ética e Sociedade e Cultura da Assembleia da República, aquando da discussão da petição contra o AO, subscrita por 32.000 pessoas.

Demagogicamente, apelidou-se de «deriva ortográfica à qual é preciso pôr cobro» a existência de duas grafias, a euro-afro-asiática e a brasileira, quando, afinal, e citando a professora Maria Lúcia Lepecki, «um brasileiro lê perfeitamente a ortografia portuguesa e um português lê perfeitamente a ortografia brasileira». Na verdade, inventam-se problemas onde eles não existem, forjando-se argumentos que facilmente são rebatidos pela sua falta de consistência. E assim prescinde-se insensatamente da vertente etimológica e da sua coerência gráfica, em nome da simplificação da língua, defendendo, com leveza, o argumento de escrever como se pronuncia, situação que ocorre na supressão das consoantes (p e c) não articuladas. Mas também os acentos se retiram, nomeadamente no Presente do Indicativo do verbo «parar» (ele para), como se se tratasse da preposição simples (para). A isto chamar-se-á simplificação, ou antes confusão? E o que dizer dos meses do ano ou dos nomes de planetas escritos doravante com minúscula?

Tem-se dito ser incompreensível a reacção dos opositores ao AO, tão pouco significativas foram as mudanças. Mas nesse caso por que razão se limitou a discussão a um grupo, completamente fechado às críticas dos seus pares, ou por que se defendeu a mudança se, na verdade, a consideram tão insignificante ou se rejeitaram os pareceres contrários ao AO, relevando apenas o da Academia das Ciências, no qual interveio, por sinal, um dos mentores deste AO (Malaca Casteleiro)? Por quê ainda a ansiedade de uma unidade da grafia, quando uma unidade morfossintáctica ou lexical será impossível? Face a tanta incoerência podemos suspeitar de sucessivas imposições de Acordos Ortográficos, valorizando sempre o estranho argumento que invoca a grandeza populacional do Brasil. O «irmão» mais forte velando pelo «irmão português» e pelos demais «irmãos de África e de Timor». Não sugeriram alguns linguistas brasileiros, os mais radicais, que em vez de língua portuguesa se chamasse língua brasileira, tendo em conta o argumento anteriormente apresentado?

Não basta lastimar ou dizer assumidamente que não cumpriremos o AO. É imprescindível que sejamos coerentes e obedeçamos às nossas convicções, trabalhando para que o texto da ILC (Iniciativa Legislativa de Cidadãos) seja discutido na Assembleia da República. Não se limitando a um simples clique, como acontece com uma qualquer petição, a ILC exige explicitamente o nosso empenhamento e o nosso esforço na sua divulgação e na recolha de assinaturas (em papel), porque só cumprirá o seu objectivo se o número de 35.000 assinaturas for atingido. Uma luta que depende exclusivamente de nós, de todos aqueles que se opuseram e opõem ao absurdo que constitui este AO.

Autora: Maria do Carmo Vieira

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Já pode subscrever a ILC e enviar “scan” por email!

A solicitação nossa, a Direcção de Serviços de Apoio Técnico e de Secretariado (Divisão de Apoio ao Plenário) da Assembleia da República acaba de nos informar que são admissíveis os impressos de subscrição digitalizados enviados por email.

Assim sendo, e mantendo-se ao mesmo tempo o envio das subscrições por correio normal (em papel, via CTT), para subscrever a ILC para revogação da entrada em vigor do Acordo Ortográfico poderá, a partir de agora, proceder também como se segue.

N.B.: se já enviou ou pretende enviar a sua subscrição da ILC por correio normal (CTT), ignore este procedimento. Evidentemente, não são admitidas subscrições repetidas.

[os conteúdos seguintes estão obsoletos/ultrapassados; é favor ignorar o que estiver traçado]

1. Abra o ficheiro com o impresso de subscrição (versão para processador de texto e envio por email).
2. Preencha com o seu programa de processamento de texto os campos necessários e obrigatórios, conforme indicado no rodapé do impresso.
3. Imprima o impresso preenchido.
4. Assine o impresso (com esferográfica ou caneta de cor preta).
5. Digitalize o impresso, preenchido e assinado, com o seu “scanner” ou dispositivo semelhante.
6. Envie-nos uma mensagem de email, com o impresso preenchido e assinado em anexo, para o endereço de email
7. Guarde o ficheiro de texto e o impresso assinado, para o caso de futuramente ser necessário confirmar, conferir ou validar a sua subscrição.

Colabore com esta Causa. Por favor, envie UMA ÚNICA VEZ a sua subscrição. Assinaturas duplicadas não são admissíveis e serão eliminadas. Os impressos digitalizados sem assinatura real (escrita à mão) ou com dados em falta não serão admitidos.

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«despertar os portugueses» – Maria José Abranches

«Fui toda a vida professora de Português (agora reformada), inclusivamente na qualidade de leitora na Universidade de Paris III, e desde 1990 que sou contra este Acordo – que li e analisei, tendo também lido muito do que sobre ele foi publicado.»
Maria José Abranches
[citação de email]

O Novo Acordo Ortográfico
Contributo para uma reflexão necessária

[excertos]

«Em Portugal – e até agora nos restantes países lusófonos – a ortografia em vigor decorre, no essencial, do Acordo Luso-Brasileiro de 1945. Parece-me que ela funciona perfeitamente, pois traduz um saudável compromisso entre a tendência etimológica, que mantém o português próximo das outras línguas românicas, e a tendência fonética, que não se pode confundir com a pura transcrição fonética da língua falada.»

«A dupla ortografia da nossa língua não impede, como não impediu até agora, nem a sua unidade, no respeito pelas suas variantes, nem a sua projecção universal, nem a sua difusão através do mundo.»

«Verificámos ser aceite por todos que – independentemente da sua unidade – a língua portuguesa tem duas normas padrão, uma americana e outra europeia, esta até agora também em uso nos países lusófonos da África e da Ásia, embora com as suas próprias variantes, o que só lhe acrescenta vida e riqueza. A dimensão universal do português está aí, reconhecida por todos – e com a ortografia dupla, o que não impede coisa nenhuma.»

«É este preconceito, ainda hoje profundamente enraizado no espírito de muitos intelectuais e políticos portugueses, que faz com que se procure dar visibilidade e universalidade à nossa língua através de “gestos espectaculares” – como esta proposta de Acordo – a milhas de distância do trabalho de gabinete e de campo que deveria ser feito.»

«Em função destas considerações, concluo que há quem esteja muito interessado e agora muito apressado na concretização deste Acordo (por questões de imperialismo, de prestígio nacional, de gloríola pessoal, de grandes lucros em perspectiva, e outras mais certamente – que não a defesa da língua portuguesa, nem da sua universalidade, que, como já vimos, não precisa deste Acordo para nada).»

[/excertos]

Estudo intitulado “O Novo Acordo Ortográfico – Contributo para uma reflexão necessária”, com data de 25 de Abril de 2008 – publicado em três partes, em três números sucessivos da “Gazeta da Beira” (16 Abril 2009 – 30 Abril 2009 – 14 Maio 2009)

[Ver texto completo deste trabalho da autoria de Maria José Abranches]

Outros trabalhos da autora

Texto de opinião: “A propósito do texto de Vasco Graça Moura, “O triunfo da Petição” (DN, 22 Abril de 2009)” – publicado na “Gazeta da Beira” (14 Maio 2009);

Texto de opinião: “Português «para inglês ver» ”, publicado no “LusoJornal” (n.º 242, 03 Fevereiro 2010) e na “Gazeta da Beira” (25 Fevereiro 2010);

Texto de opinião: “A propósito das declarações do actual Embaixador português em Paris”, publicado no “LusoJornal” (n.º 250, 31 Março 2010) e enviado para a “Gazeta da Beira”.

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Movimento online quer juntar 35 mil contra acordo [Sapo] [media] #AO90

Movimento online quer juntar 35 mil contra acordo

Maria do Carmo Vieira é professora de Português e uma das mentoras de um movimento que nasceu nas redes sociais para travar a aplicação do novo acordo ortográfico. Quer juntar 35 mil portugueses em torno da causa – uma meta ambiciosa, admite, mas nunca ‘uma luta perdida’.

O novo acordo entrou em vigor oficialmente a 1 de Janeiro. Mas Maria do Carmo Vieira acredita que ainda não é tarde para voltar atrás: ‘esta iniciativa surge de alguém que não se resignou’.

Há dois anos atrás, um outro grupo de cidadãos e personalidades públicas (encabeçadas pelo antigo eurodeputado Vasco Graça Moura) levou ao Parlamento uma petição com 32 mil assinaturas. Apesar do esforço, os deputados acabaram por dar luz verde ao novo acordo.

‘No fundo, foi tudo em vão’, recorda hoje Maria do Carmo Vieira. E, por isso, a professora de português, em conjunto com o tradutor João Pedro Graça e outros apoiantes da causa, decidiram ir mais longe desta vez, lançando uma iniciativa legislativa de cidadãos.

Na prática, explica a docente, ‘é uma iniciativa que tem a força de projecto-lei’ – o que significa que, uma vez no Parlamento (e com o apoio de uma maioria dos deputados), o projecto poderia até revogar o acordo ortográfico, regressando o país à velha ortografia.

Para isso, são necessárias 35 mil assinaturas – uma meta ambiciosa, que os organizadores do movimento querem atingir até ao Verão. Afinal de contas, a menos que a iniciativa seja avaliada antes das férias, nada impedirá a aplicação do acordo nas escolas já no próximo ano lectivo.

Mobilizar contra o acordo

E é nas redes sociais que a causa tem encontrado maior capacidade de mobilização. No Facebook, o movimento ‘Não queremos o acordo ortográfico’ ultrapassa já os 65 mil apoiantes que, com frequência, acabam por levar a causa para as ruas.

‘Temos recebido algumas centenas [de assinaturas], mas há também centenas de pessoas a recolhê-las’, assegura Maria do Carmo Vieira.

As dificuldades, por agora, são sobretudo burocráticas: ‘a recolha de assinaturas é feita em papel e há uma série de itens que se têm de preencher, é preciso o cartão de eleitor e, normalmente, as pessoas nunca o têm’.

Para lá dos obstáculos burocráticos, Maria do Carmo Vieira queixa-se da ‘falta de abertura da comunicação social’ em relação à iniciativa, bem como ‘abandono’ a que foram votados, por alguns dos primeiros subscritores da petição levada ao Parlamento em 2008.

Nada que não possa ser ultrapassado, diz a professora de Português: ‘as pessoas têm de ter consciência da aberração que é este acordo’.

Dar voz aos falantes

‘A evolução da língua faz-se com a passagem do tempo, faz-se com a intervenção dos falantes e não é por acordo, porque quando alguém me diz que a língua tem de evoluir’, defende Maria do Carmo Vieira. Por isso, critica a forma como a transição para o novo acordo foi conduzida pelo Governo português – um referendo teria sido, aos olhos da professora, uma alternativa mais democrática.

Aconteça o que acontecer, Maria do Carmo Vieira não está disposta a baixar os braços – até mesmo dentro das salas de aula onde lecciona: ‘Eu não vou deixar de escrever como escrevo e, se os meus alunos porventura me escreverem à maneira do acordo, eu obviamente que não ponho erro, mas vamos ter duas grafias’.

@Marco Leitão Silva e Inês Gens Mendes

[cópia integral, incluindo código, de artigo com reportagem vídeo da autoria dos jornalistas Marco Leitão Silva e Inês Gens Mendes, publicado no Portal Sapo (“Dossier Acordo Ortográfico“) em 27.04.10.]

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«Porque tudo depende de nós» Maria do Carmo Vieira

Se queres mel, suporta as abelhas, escreveu, no século XVI, Erasmo de Roterdão (séc. XVI), máxima que se aplica a todos os tempos e que põe em evidência quanto perdemos em dignidade, desistindo da nossa intervenção crítica.

Entre muitas outras situações, em que revemos, directa ou indirectamente, aquelas palavras, sobressai a forma como nos foi imposto o Acordo Ortográfico de 1990, apresentado como uma espécie de «mel» que facilitaria a escrita, simplificando consequentemente a língua portuguesa, justificação, aliás, em sintonia com a pouca exigência que reina também no Ensino. Com efeito, nada menos científico e, aparentemente, mais melífluo, pela apregoada facilidade, do que «escrever como se pronuncia». Mas estranhamente, e na lógica do absurdo, multiplica-se a publicidade de acções de formação, pagas pelos inscritos, com o intuito de os ensinar a escrever à moda do Acordo Ortográfico que, afinal, surgira para simplificar a escrita.

Foi assim que um grupo de linguistas, portugueses e brasileiros, mascarados de investigadores competentes, entrou em cena, representando o deplorável espectáculo do Acordo Ortográfico. E, por incrível que pareça, este trabalho, jogo de cedências desiguais na dependência do mais forte, foi também justificado pela necessidade de a língua evoluir. Viemos a saber, posteriormente, por diversas intervenções de actores e apoiantes, que o argumento de peso tinha afinal sido a dimensão populacional do Brasil, face aos restantes países da CPLP, e que em nome desse novo valor «democrático» se justificava a decisão tomada, ao arrepio da opinião crítica de inúmeros linguistas e dos próprios falantes. Adequada também a uma estranha postura democrática foi a alteração, de cariz colonialista, que ditada pela pressa de assinar o referido Acordo, abdicou da exigência de unanimidade entre os oito países constituintes da CPLP, tendo bastado a aprovação de Portugal, Brasil e Cabo-Verde.

Porque tudo depende de nós, impõe-se que não desistamos desta Causa, aproveitando a possibilidade de intervir com mais consistência através de uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC), com força de projecto de lei, com a finalidade de revogar a Resolução da Assembleia da República nº 35/2008 que determinou a entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990. O processo é exigente, pois requer a recolha de 35.000 assinaturas em papel, encontrando-se toda a documentação no endereço http://cedilha.net/ilcao.

Apelamos a todos os que não concordam com este Acordo Ortográfico que divulguem esta ILC e recolham o maior número possível de assinaturas.

Maria do Carmo Vieira (22 de Abril de 2010)

[Texto recebido por email.]

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