No seguimento da audiência na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, que teve lugar no dia 12 de Julho de 2012, transcrevemos o respectivo relatório, disponibilizado no “site” da Assembleia da República.
Assembleia da República
Comissão de Educação, Ciência e Cultura
12.Julho.2012 – 14h00
RELATÓRIO DE AUDIÊNCIA
Entidade: Maria do Carmo Vieira, João Pedro Graça, Pedro Afonso, João Ricardo Rosa, Hermínia Castro e Teolinda Gersão
Recebidos por: Deputados Pedro Pimpão (PSD) e Conceição Pereira (PSD)
Assunto: Acordo Ortográfico
Exposição: O Sr. Deputado Pedro Pimpão (PSD) apresentou as boas-vindas aos audientes, que agradeceram a concessão da audiência, justificando o seu pedido com a necessidade de darem conta do andamento do movimento cívico de resistência ao acordo ortográfico e da Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) pela revogação da entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990, que conta já com milhares de subscritores.
O Dr. João Pedro Graça fundamentou a Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC), apresentando os seguintes aspectos:
- A entrada em vigor do Acordo Ortográfico foi aprovada em sede de votação parlamentar (Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008) e entrou em vigor com aResolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, apesar dos pareceres negativos, dos mais reputados especialistas e das mais prestigiadas instituições, e contrariando manifestamente a opinião pública em geral;
- Porém, apenas a partir de 1 de Janeiro de 2012, com a efectiva aplicação da “nova ortografia”, a população portuguesa se apercebeu do erro colossal que é este acordo e que se torna agora imperioso corrigir;
- São cada vez mais evidentes os sinais de incómodo e de repúdio pela entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90), o que se pode facilmente aferir pela profusão de artigos de opinião, entrevistas, mesas redondas e colóquios, tomadas de posição públicas;
- Este movimento de resistência ao “acordo ortográfico” é comprovável pelo facto de largos milhares de pessoas terem já subscrito a Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) pela revogação da entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990.
Interveio, de seguida, Pedro Afonso, aluno do Instituto Superior Técnico, que se referiu à moção aprovada na Assembleia Geral de Alunos do Instituto Superior Técnico, no sentido da revogação do Acordo, por se entender que não serve os princípios para os quais foi criado. Chamou ainda a atenção para as diferenças que existem entre o português de Portugal e do Brasil, designadamente ao nível da fonética.
João Ricardo Rosa, aluno da Universidade do Algarve, referiu-se à consistência que se verifica quanto à vontade de revogar o Acordo, anunciando a intenção de apresentar também uma moção naquela instituição. Fez ainda referência ao desconhecimento das regras por parte de quem utiliza a nova ortografia.
A Dra. Hermínia Castro sublinhou a diferença entre o português de Portugal e o do Brasil, considerando irreal que unificando a grafia se unifica a língua. Considerou ainda que o documento em que se baseia o acordo não tem sustentação ou fundamentação teórica.
A Dra. Teolinda Gersão considerou impossível uniformizar a língua em todos os países, contendo cada um o seu vocabulário próprio e a sua sintaxe específica. Afirmou ainda que a língua é a mesma mas transfigura-se, de acordo com quem a utiliza, sem perder, no entanto, a sua identidade. Terminou, apelando aos Deputados para que corrijam este erro, que tem criado grande confusão e gerado perda de energia, sendo, no entanto, uma causa inútil.
A Dra. Maria do Carmo Vieira considerou que a Assembleia da República não honrou o País quando votou este Acordo, chamando a atenção para o facto de este ignorar a etimologia, a origem da palavra, que constitui uma importante componente cultural. Apelou aos Deputados, para que se empenhem na correcção deste grave erro, que constitui um atentado à educação e à cultura de Portugal.
Interveio, de seguida, a Sra. Deputada Conceição Pereira (PSD), que saudou a iniciativa e a forma como os seus dinamizadores defendem a língua portuguesa, que constitui o nosso mais rico património, segundo considerou. Referiu-se ainda à complexidade desta temática, que é fracturante na sociedade portuguesa, pelo que disse aguardar com expectativa e abertura a Iniciativa Legislativa dos Cidadãos.
A documentação da audição, incluindo a gravação áudio, encontra-se disponível na página da Comissão, na Internet.
Palácio de São Bento, 12 de Julho de 2012
A assessora
Cristina Tavares
Documentos associados à audiência:
Documentação entregue [formato PDF]: [cópia local] [original A.R.]
Relatório da audiência [formato PDF]: [cópia local] [original A.R.]
Links associados à audiência:
Gravação áudio: [cópia local] [original A.R.]
Gravação da audiência
6 comentários
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A mais subida homenagem a todos estes patriotas. Quem ainda tivesse dúvidas sobre o assunto poderia, em menos de uma hora, ficar a entender até que ponto é importante tomar posição contra o aberrante AO90. Num país onde tudo é descartável e até a memória parece ter perdido os horizontes (J. H. Saraiva entenderia muito bem, pois lutou contra o esquecimento de quem fomos), ouvir a gravação que publicam no sítio da ILC devolveu-me os avulsos laivos de portugalidade, quando de bom grado eu abandonaria este chão que me viu nascer e me renega todos os dias. Por momentos, esqueci a vergonha que tenho de ter nascido num país de raquíticos intelectuais e de vendilhões que desbaratam o que não lhes pertence, neste caso, um Património linguístico inigualável!
Aos representantes da ILC, por serem o oposto dos traidores que menciono acima, agradeço do fundo da alma. Por momentos, acreditei que este estado-nação era ainda a casa que já não reconheço como minha. Este país cospe todos os dias naquilo que deveria vir a ser. Os seus habitantes (que não são “o seu povo”) preguiçam em esplanadas, plenos de auto-comiseração. A seguir à língua-mátria, creiam-me, virá a destruição do Douro (quase, quase ex-Património Mundial da UNESCO), que já foram rebaptizando: agora, é o “Douro Internacional” e já começou a ser vendido a retalho… Esta gentalha que por aqui mora torna o país mal frequentado e tanto lhe faz ser como não ser, quando a “Nova Ordem Mundial” aponta o horizonte imediato: o do lucro/obediência! Deplorável país de carneirada, este. Merece todo o mal que lhe aconteça.
Os meus parabéns pelos excelentes depoimentos que prestaram aos Sr.s Deputados. Infelizmente dói-me a forma oblíqua que a Sr.ª Deputada Conceição Pereira arranjou de menorizar os depoimentos que prestaram e de tentar colocar-nos (aos apoiantes da ILC) “no nosso lugar” sem o querer assumir abertamente. Nem podia faltar a insinuação de ah e tal se estudam tecnologias deviam ser a favor do que é “novo” e “moderno”. Só faltou dizer para irem pela sombra, etc.
Basta pegarmos num livro do príncipio do século XX e facilmente constataremos muitas diferenças gráficas, como por exemplo:
commissario
auctoridade
offerecer
allemão
commercio
thermometro
affirmar
jury
official, (e o seu plural) officiaes
monarchia
d’elle
d’ella
d’este
d’aquelle
n’esse
n’essa
pharmacia
elephante
sêco
Victor
Luíz
Benguella
Mossamedes
Pôrto
Cintra
Cezimbra
Barca d’Alva
(e muitas mais)
Outras alterações foram acontecendo desde então até ao AO de 2008. Pergunto aos resistentes se deveremos por em causa todas essas alterações? e porque não poderá a língua portuguesa continuar a evoluir tendo em atenção os restantes PALOPs, onde incluimos, obviamente, o Brasil?
@ Zé da Burra o Alentejano: Acha, portanto, que a língua portuguesa não pode evoluir, ou não estava a evoluir, sem o AO? (Que, já agora, é de 1990 e não de 2008.)
Nós, os resistentes, não somos um bando de saudosistas, somos apenas contra a idiotice em que consiste o AO90. Achamos que a língua portuguesa só é prejudicada (em todos os países onde se fala português, não apenas em Portugal) com essa invenção estapafúrdia. Se queriam intervir na ortografia da língua, fizessem-no com algo que tivesse um mínimo de coerência, inteligência ou ao menos utilidade. Coisas que o AO90, comprovadamente, não tem.
Ao que a língua portuguesa está a evoluir, como sempre tem acontecido com esta e com todas as restantes línguas do planeta, só que não poderemos ser soberbos e querer impor ao universo de 220 milhões de brasileiros a nossa vontade, por isso devem ser feitas aproximações regulares entre as várias versões do português. Não devemos esquecer-nos que o Brasil é independente há menos de 200 anos e o português (BR) já diverge muito do português (PT), daqui a outros tantos anos e as línguas terão quer ser consideradas como diferentes se continuarem a divergir. Nem eu nem os resistentes estarão cá nessa altura mas as nossas decisões serão então julgadas.
O Latim não deixou de ser uma língua respeitável mas é hoje uma língua do passado.
@Zé da Burra o Alentejano: Típico. Nada como desviar a questão. Portanto, será uma grande calamidade se por acaso o Pt-Br e o Pt-Pt vierem a ser consideradas duas línguas diferentes? Tal como foi uma grande calamidade o latim ter originado uma série de línguas diferentes? E, já agora, nós não poderemos “ser soberbos e querer impor” a nossa vontade, mas o Brasil já poderia, lá porque tem mais falantes? Isso é uma dualidade de critérios muito interessante, sem dúvida. E que tal ninguém impor nada a ninguém e respeitarem-se a riqueza e a diversidade de todos, ao invés de se impor um acordo (muitíssimo) mal feito e que não resolve coisíssima nenhuma? Aqui lhe deixo esta ideia revolucionária.