O escopo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AO90), unificação e fortalecimento do prestígio internacional da Língua Portuguesa (L.P.), é quimérico. Uma alucinação. Só plausível no mundo ficcional das mentes mais ingénuas, crédulas e de apurado romantismo. Se por um lado é quixotesco acreditar na possibilidade de unificar as diferentes variantes da L.P. através de uma normatização ortográfica, por outro, o AO90 arrima-se em critérios e argumentos questionáveis, contraditórios, inconsistentes e ilógicos. Ao mesmo tempo que resulta de uma medida prepotente e antidemocrática do Governo português.
A Língua não é estanque. É viva e evolui moldando-se ao uso, espontâneo, dos seus falantes e escreventes. A evolução imposta pelo AO90 de natural nada tem. É uma evolução artificial, imposta por decreto, que o uso e o hábito ainda não consagraram. A firmação deste acordo revela falta, além de razão, coerência e visão, de bom senso. As diferentes variantes da L.P. distinguem-se não só pela grafia e fonética mas também pelo vocabulário e sintaxe frásica. Diferenças essas a que o AO90 não responde e que qualquer norma ortográfica jamais conseguirá colmatar. Sob a égide da utópica unificação linguística o AO90 mutila e desfigura a ortografia da L.P e, juntamente, todo o valor histórico, cultural e identitário que cada variante encerra.
Admitindo uma pluralidade de casos de dupla grafia, algumas delas inéditas para ambas as variantes, o acordo contraria o fim a que se propõe. Admitindo grafias facultativas o AO90 não unifica, apenas consagra a diferença. As consoantes mudas suprimidas influem no timbre das vogais precedentes, abrindo-as. Caso contrário, “recepção” e “recessão” ler-se-iam do mesmo modo. Por isso, a sua manutenção não se prende com a teimosia lusitana como é referido, ingenuamente, na “Nota Explicativa”. A abolição, facultativa ou não, destas consoantes pode desencadear alterações fonéticas nestes vocábulos.
Por outro lado, a sua abolição destrói a harmonia gráfica em morfemas lexicais, dificultando o reconhecimento lexical entre formas afins (Ex.: Egi(p)to, Egípcio). A supressão da acentuação entre formas verbais homógrafas do presente e do pretérito perfeito do indicativo aumenta a ambiguidade do texto escrito. As facultatividades e mutilações do AO90 admitem uma multiplicidade de fonéticas e de grafias dentro da mesma variante da Língua, dependente de juízos individuais. Estes fenómenos costuram uma babel na L.P., até então inexistente, que dificulta a sua aprendizagem.
Além dos avultados custos sociais e culturais, o AO90 acarreta também consideráveis custos económicos: substituição de milhões de livros, ferramentas informáticas, documentos, etc., que assim ficam obsoletos, e perda de posição das exportações de edição portuguesa para o mercado brasileiro.
Este acordo foi forjado nas costas dos portugueses, à revelia dos seus interesses. Antes da sua entrada em vigor não só foram ignorados, sistematicamente, os pareceres negativos de inúmeras personalidades da área como não foi requerido nenhum parecer técnico e científico no sentido de mensurar as (des)vantagens, à semelhança do que é feito em tantos outros projectos. Resultado de uma medida precipitada e irreflectida, a entrada em vigor do AO90 constitui uma irresponsabilidade social, política, geoestratégica e económica. Este acordo serve unicamente interesses de índole geopolítica e empresarial, ortogonais aos dos portugueses, pelos quais o nosso erário está a ser saqueado e a nossa Língua prostituída.
Dirijo ao leitor um convite. Convido-o a ler o documento do AO90 e a respectiva “Nota Explicativa”. Se não for filólogo ou linguista não se amedronte. Também não o sou. Garanto-lhe que uma modesta dose de bom senso é mais do que suficiente para constatar a incoerência deste acordo. Um autêntico dislate que não assevera qualquer mais-valia.
O AO90 não é inevitável. Através de uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos é possível libertarmo-nos dos seus grilhões. Saiba mais em: www.cedilha.net/ilcao.
Pedro M. Afonso
Dirigente associativo estudantil no IST (Instituto Superior Técnico)
In jornal “Público” de 23.08.12, página 47. Link para a versão online disponível apenas para assinantes do jornal.
26 comentários
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Acabo de regressar de uma viagem de vários dias a Portugal. Vim escritas no tele-texto da TV “palavras” (?) como *INTERCETAR, *ESPETACULO (sim, como se fosse uma palavra paroxítona),*EXCEÇAO, *FATO, *JATO *CORRETO… e um sem-fim de aldrabices que seria até doloroso enumerar.
Língua minha, por que te querem matar? Quem receberá os lucros deste crime? Passará esta época à história pola indiferença de aqueles que te tinham de defender e nada figeram contra esta cambada de medíocres desmiolados que te deturpam todos os dias? Seremos já essa sociedade de zombies anelada polos poderes fácticos, sociedade já incapaz de pensar e de reagir contra as injustiças? Teremos que ver desde este lado do Minho, desde esta Terra que partilhou o teu berço, como te vas descaracterizando e amarfanhando enquanto impunemente che injectam os bacilos que levam a doença da incultura e da insignificância?
Caro Bento.
Quem escreveu “espetaculo” escreveu com erro, seja na versão antes ou depois do Acordo. “Espetáculo” não é palavra grave e escreve-se com “á”.
Quem escreveu “fato” estava certamente a referir-se à peça de vestuário ou a um conjunto de cabras. Se queria escrever “facto” escreveu mal, mesmo depois do Acordo.
Não vale a pena denegrir a causa dos que combatem sinceramente o Acordo usando demagogia, mentiras e ignorância, porque isso só vai desacreditá-los.
No seu caso, claro que há razões para certas confusões (entendo que será da Galiza e, por isso, as suas imprecisões são naturais).
Saudações.
Só tenho a ENALTECER quem permanece firme e resistente à tendência escandalosa de adoptar o novo acordo ortográfico. Entidades como a RTP, a SIC, a TVI, a DOVE, a SONAE, a FNAC (que tanto se considera promotora de [CU]LTURA), o BPC, a CGD, o MONTEPIO, o LIDL e a maioria dessas “revistazecas” de nível zero pelas bancas estão TODAS chumbadas!!!
DE parabéns estão: o PINGO DOCE, o CORREIO DA MANHÃ, a NIVEA, o CCB, o PÚBLICO, EU e muitos milhares de inteligentes cidadãos!!
Só tenho pena que ainda haja muita gente que não assinou a ILC. Na prática, efectivamente, é muito simples rejeitar o novo AO. Façam o «download» do formulário da ILC e assinem. Aproveitem e coloquem os vossos amigos/familiares a fazer o mesmo!! TODOS juntos vamos acabar com esta infecção política!
Abraço a todos!
Sr. Artur Costa:
As palavras indicadas foram observadas em serviços de tele-texto (RTP e SIC para ser mais concretos). E o termo FATO aparecia na construção DE FATO, e não se referia a uma vestimenta senão que equivalia na agora chamada “ortografia antiga” a DE FACTO.
Quanto à sua forma de entender a minha intervenção (“Não vale a pena denegrir a causa dos que combatem sinceramente o Acordo usando demagogia, mentiras e ignorância”), além de ser uma soma de preconceitos apriorísticos sem qualquer base e um julgamento com condena dessa intervenção sem qualquer argumento nem razoamento, só vou responder assim: “O que João diz de Pedro, diz como é João, não como é Pedro”. Frases como esta aparecem nos livros de paremiologia. Espero que a minha “natural imprecissão” não seja um empecilho para perceber o que quero dizer.
Na conjuntura da língua falada, “o povo é quem mais ordena” (foi e sempre srá). Já, porém, na língua escrita, ordena quem pode e aceita quem (não) tem juizo, pois quem pode ordenar está pouco se lixando para os valores e ordens populares. Assim sendo, tanto cá (escrevo do Brasil e em Português do Brasil) como lá, os do poder conhecem como ninguém uma frase já bastante antiga que diz: “Se fizeres sempre tudo acertadamente nunca serás notado, só serás notado quando cometers algum erro”. Isto posto, vejam: Os intelectualóides de cá, (Brasil) vivem a meter o bico onde não são chamados – a língua não é deles, que acompanhem a língua dos portugueses e calem a boca; ou regulamentem a língua dos brasileiros, se tiverem capacidade para isso, e façam o que quiserem com ela. Já os de lá (Portugal), neste caso políticos, metem-se a estapafurdices linguísticas com a falsa e burra intenção de maior internacionalização da Lingua Portugusa, quando na verdade, sua intenção rel é a de causar polémica e tornarem seus nomes conhecidos, aida que por motivos nada nobres, pensando em eleições futuras. E quem paga por toda essa estroinice? Todos aqules que se usam da palavra escrita, sejam intelectuais ou simples operários que só querem comunicar-se com seus amigos e parentes de uma forma razoavelmente culta e educada, o que não é possivel quando sua lingua vive a sofrer solavancos como este que está agora a acontecer. Espero sinceramente que nas próximas eleições os eleitores portugueses não se esqueçam do motivo que tornou os nomes dessas pessoas tão conhecidos.
Caro Bento,
Tem toda a razão. Em todo o caso, eu penso que o problema é: não devemos confundir a justa oposição ao AO, que é nova, com erros de ortografia, que são velhos.
Dou-lhe os meus parabéns pelo seu português escrito porque ninguém diria que é galego se não tivesse dito.
Esperemos que a Galiza adira à ortografia portuguesa, mas à nossa, não à outra, como me parece que quer a maioria dos reintegracionistas, mas posso estar enganado, depois nos dirá.
Caro Bento
Compreendo-o perfeitamente. É pena que não me tenha compreendido a mim. Se acha que os erros que refere se devem ao Acordo Ortográfico, fica consigo essa conclusão. Pessoalmente, nunca escrevi nem escreverei “de fato” nem “espetaculo”. Isso são erros de ortografia.
Infelizmente, semelha que o reintegracionismo (ou as suas entidades e publicaçoes mais representativas) tomaram o rumo do AO, quer dizer, o rumo para o abismo.
Razoes? Nao as posso saber ao certo. Imagino que após 30 anos de implacável imposiçao da ortografia espanhola e de impossibilidade de mudar em nada a castelhanizaçao da nossa Língua, esta tomada de posiçao é uma espécie de “fugida para adiante”. Outra razao poderá ser o facto de as suas posiçoes (as minhas até chegar o AO) nunca terem encontrado no Portugal oficial nada mais do que a indiferença, imagino que esperavam algo diferente desse Portugal oficial no que diz respeito à preservaçao e defesa da Língua que entendemos como comum…talvez esperem algo diferente do Brasil, nem o sei.
Em todo caso, ambas as “razoes” anteriores, por muito verdadeiras que possam ser, sao factores extrínsecos para o problema que nos ocupa; e nao podem ser uma desculpa para aderir ao AO nem implementar toda a descaracterizaçao histórica e etimológica que este supom.
Depois estám todos os razoamentos “pragmáticos” a favor do AO, que já tenhem sido aqui rebatidos uma e outra vez, e aos quais muitos reintegracionistas galegos aderem sem muito senso crítico nem capacidade de análise.
No fundo, acho que há um reconhecimento de que a batalha pola nossa Língua na Galiza, entendida como uma variedade com as suas singularidades morfológicas e fonéticas, está perdida. Melhor, pois, subir-se ao carro ganhador, ou mais bem abeirar-se da árvore que dá mais sombra. Suponho que a miragem de um Brasil de 200.000.000 de habitantes, em caminho de ser uma das grandes referências económicas do planeta e com a conseqüente influência política e cultural que isso acarretará…é uma miragem à qual é difícil resistir quando essas pessoas comparam Brasil com Portugal, esse Portugal que para esses senhores ( e nao lhes posso negar a sua razao) jamais se interessou pola sorte da sua Língua na Galiza, ou sempre a considerou estranha.
Quanto ao outro assunto: INTERCETAR nu lugar de INTERCEPTAR é uma falta de ortografia? Ou os senhores estám a pensar na palavra INTERSECTAR? Estou a falar do termo que significa “pôr obstáculos”, “impedir o curso normal de algo”. Para mim, aqui, o que há é a aplicaçao implacável do AO, anulando outro grupo consonântico latino, outro desses grupos aos quais estes senhores acordistas tenhem alergia.
ESPETACULO poderá ser uma falta de ortografia, mas nao se pode evitar deixar de pensar numa proposta que já lim dos acordistas, que era a de suprimir os acentos gráficos nas palavras proparoxítonas.
Por outro lado, talvez ingenuamente, eu pensava que num tele-texto se cuidava a ortografia; se isso eram faltas de ortografia, acreditem que seriam inconcebíveis num tele-texto espanhol: é muito raro ver neles algum erro, quer na televisao pública, quer nas privadas.
(Desculpem a ausência do símbolo ~ acima das vogais, no programa que estou a usar nao me permite escrevê-lo, pois quando o utilizo escrevo palavras como n~ao; só se utlizo o cortar e colar as palavras de um dicionário, mas isso é uma chatice).
Gostaria de frisar o comentário do leitor Nuno Augusto Pontes brasileiro, mais acima, concretamente neste passo:
« Os intelectualóides de cá, (Brasil) vivem a meter o bico onde não são chamados – a língua não é deles, que acompanhem a língua dos portugueses e calem a boca; ou regulamentem a língua dos brasileiros, se tiverem capacidade para isso, e façam o que quiserem com ela. Já os de lá (Portugal), neste caso políticos, metem-se a estapafurdices linguísticas com a falsa e burra intenção de maior internacionalização da Língua Portuguesa, quando na verdade, sua intenção real é a de causar polémica e tornarem seus nomes conhecidos, ainda que por motivos nada nobres […]»
Cumpts.
B:
Eu não disse que intercetar é erro. Só falei de fato e de espetáculo. Tanto intersetar (intersectar, agora com dupla grafia) como intercetar (interceptar, antes do AO) estão corretas.
@ Arthur Costa
Vossemecê diz que tanto intersectar sem «c» como interceptar sem «p» estão correctas sem «c»?… Deve ter apanhado reguadas que se fartou. E não se perdeu nenhuma.
Cumpts.
Embora seja óbvio, quando reproduzim a escrita de aqueles vocábulos pretendia fazer notar os efeitos do AO; em nada do que escrevim se pode deduzir que as entendia como falta de ortografia. Foram outros intervenientes os que me endossaram esta intençao e deduziram dela propósitos que para nada estavam na minha mente, para além de uma presumível confusao devida à minha condiçao de galego.
@Bento
Fez muito bem. O Acordo não está em vigor. Todos os exemplos que nos mostrou são erros grosseiros de ortografia ainda há pouco dignos da maior comiseração. Só burros muito grandes escrevem assim. E só no Brasil é que aquilo passa por correcto pela simples razão de os tratantes de lá terem renegado o Acordo de 45 que firmaram por sua vontade, sem nenhuma espécie coacção. Tratantes sem moral que não merecem condescendência de quem desrespeitaram, os portugueses, enquanto não derem mostra de boa fé, cumprindo o acordo de 45. Ceder num princípio de idoneidade tão simples e abdicar da identidade própria que se guarda no idioma nacional dum pequeno povo que o levou pelos quatro cantos do Mundo sem necessidade de brasis, de acordos, ou de ortografia unificada nenhuma, é enganar a gente. Mutilar e desfigurar vilmente uma língua romance, e justificar esse desconchavo com mentiras tão grosseiras que ofendem a inteligência mais pueril, é digno do maior castigo. E em nome de quê? Duma perspectiva de idioma ao quilo (n.º de falantes, não é como dizem?) e duma tiragem de maus dicionários que ninguém quere?…
Amigo Bento, obrigado!
@ Bic Laranja
A sua escrita é fina. É mesmo a alegria dos analfabetos. Recomendo-lhe que consulte qualquer dicionário (atenção: não escreva diccionário…).
Depois de aprender alguma coisa, evitando desfigurar uma língua que, obviamente, não domina, venha escrever em público. Antes, tenha recato e respeite quem não conhece – a mim e a todos os que dão tanto valor ao Acordo de 1990 como ao de 1945. E aos linguistas que defendem o Acordo – tal como eu respeito os que o atacam, com argumentos sensatos e tecnicamente corretos, sem demagogia nem patriotismos balofos.
Obrigado a você por nao procurar outro propósito para a minha primeira intervençao que aquele que verdadeiramente tinha: sublinhar o empobrecimento e o avulgaramento que para a nossa Língua implica o AO. Deveria haver nos Códigos legais a hipótese de castigar a quem comete crimes culturais, nao acha? Crimes como este, que decepa a nossa identidade histórica e lingüística e que nos afasta, através da imposiçao prepotente da vaidade dos néscios, das outras línguas românicas da Europa.
O castigo, para mim, seria singelo e já o expugem noutra intenvençao: a instituiçao grega do OSTRACISMO. Estes senhores deveriam ser expulsos da sua terra durante 10 anos e, ao regresso, nao poderiam voltar a ocupar qualquer lugar de responsabilidade pública para o qual tenhem demonstrado a sua indignidade e a sua incompetência.
Eu hoje estava na FNAC a ver as traduções novas, e é perturbador como desde 2012 praticamente todos os livros estrangeiros já são traduzidos segundo o novo acordo ortográfico. Bem, tendo em conta que eu leio em 4 línguas (português incluído), acho que a solução é deixar de comprar livros na minha própria língua, e encomendar tudo pela Amazon e Book Depository. Sinto-me como aqueles capitalistas nojentos que deixam o dinheiro nas contas off-shore, mas é a vida; eu bem gostaria de dar o meu dinheiro às livrarias e editoras portuguesas, mas não vou começar a ler mau português pelo bem da economia, especialmente quando a economia foi destruída pelos mesmos que agora destroem a língua. Há princípios maiores a seguir.
Mas o que isto tem de mais triste é como os tradutores, as pessoas que fazem das palavras os eu sustento, se renderam tão facilmente ao acordo, sem resistência. E como as editoras, que deveriam ser, penso, regidas por amantes da cultura, por espíritos livres e irreverentes, se renderam também tão facilmente aos ditames do estado. E deixa-me a pensar se foram os tradutores que agora traduzem isso de livre vontade, ou se são as editoras que os obrigam a isso. Qualquer que seja o caso, é lamentável e esperava mais dos nossos senhores e senhoras das letras.
Ena, isto hoje está animado, quase parece a slashdot…
Os meus parabéns ao Pedro M. Afonso por um excelente artigo e uma excelente intervenção junto da opinião pública em defesa da rejeição activa do AO90, e não da “abstenção violenta” que por aí grassa.
@Miguel: quase todos os editores são uns vendidos, a que não é estranha a concentração das edições na Leya e os devaneios desta de se tornar um editor no Brasil (boa viagem com isso, recomendo os posts muitíssimo argutos de um blogger Brasileiro em http://bit.ly/OgnUPJ).
Por outro lado a permeabilidade da edição ao AO90 é muito grande devido à digitalização do processo editorial: é fácil a integração do AO90 porque não existe nenhuma intervenção humana nisso. Na realidade todos os tradutores, escritores e editores continuam a escrever segundo o AO45. A seguir os textos passam por um conversor ortográfico e pronto… saem em AO90. E cheios de disparates. Daí que agora já não há factos mas FATOS e já não há espectáculo mas ESPECTACULO. E já não há contactos mas CONTATOS. Etc. Etc. Sim, bem podem os acordistas berrar que no português de portugal não é assim pelo AO90. Ninguém escreve com AO90. Quem “escreve” com AO90 é… software. Não são pessoas. E os conversores ortográficos convertem assim. E de tanto a lerem e verem é essa a norma que as pessoas irão seguir.
@Artur Costa: daí que @Bento tenha toda a razão e o senhor não.
É esta praxis do AO90 que vai vingar e não as teorias. Aliás, o AO90 só serviu para fazer as pessoas “desligarem o cérebro” e desistirem de pensar em regras e se está certo ou errado. Agora o que interessa é escrever qualquer coisa e tanto faz porque “se entende”. Não as podemos criticar. É essa a teoria dos doutos proponentes do AO90. A de que tanto faz a grafia porque “todos” sabem como se pronuncia. Com os mesmos argumentos outros antes deles eliminaram o uso do trema e com isso alteraram para sempre a pronúncia do português de Portugal. Apenas um ou dois exemplos que me ocorrem de momento, mas há muitos mais:
Paisagem. Era païsagem. Pronunciava-se pa-i-sa-gem. Agora pronuncia-se pai-sa-gem.
Sequestro. Era seqüestro. Pronunciava-se se-cu-es-tro. Agora pronuncia-se se-ques-tro.
Quinquénio. Era qüinqüénio. Pronunciava-se cu-in-cu-é-ni-o. Agora pronuncia-se quin-qué-nio.
Todos sabiam como se pronunciavam as palavras por isso o trema era redundante e podia abolir-se para simplificar. Só a relação entre pronúncia e escrita é muito mais complexa e intercomunicante do que isso. Os “todos” morreram e os que vieram a seguir basearam-se nas regras de como ler em português e passaram a pronunciar de outro modo. O mesmo fenómeno acontecerá agora se o AO90 não for rejeitado. Alguém acredita, honestamente, que “ação” se pronunciará “á-ção”? Daqui a meia dúzia de anos ouvir-se-á “a-ção”. “Ator” será “a-tor”. “Atriz” será “a-triz”. É assim que se lê. Ninguém lê arvore “árvore”, lê ar-vo-re. Arvore (do verbo arvorar) e árvore são distintas. Ninguém lerá “ação” de outra maneira que não “a-ção”. Os sofismas ao abrigo dos quais foi concebido o AO90 são apenas isso, sofismas. E empobrecerão para sempre a língua transformando-a de forma artificial em algo que já não será português, como bem aponta no seu artigo o Pedro M. Afonso.
@Miguel: outro problema é a dependência das editoras das edições escolares. Como o governo se armou em tiranete e obrigou os livros escolares a serem impressos em AO90 todas as editoras com negócios de edição escolar se apressaram a “acordizar-se”. Os tempos dos livreiros livres e com ideais de defesa da Cultura e da Educação morreram. Agora só querem é dinheirinho e tanto lhes dá se editam Jorge de Sena ou a livralhada que por aí anda das “personalidades” da TV. O que interessa é que a malta compre.
Também eu compro muito menos livros. Já experimentei ler livros em AO90 e é um exercício infernal, estar palavra-sim palavra-não a tropeçar com um homografia e ter de pensar se naquele contexto é a palavra x ou a palavra y. Só quem não lê (ou pelo menos não lê algo cuja complexidade exceda a lista de compras ou receitas culinárias muito simples) pode achar que o AO90 é apropriado ao uso intelectual da língua portuguesa. Só ainda compro livros em português porque vou deparando com títulos de tiragens de edição anterior a 2012 (felizmente anda são bastantes) e alguns de editoras que têm a coragem de não aplicar o AO90 (muito poucas). Se o AO90 “pegar”, deixarei de comprar livros em português. Como leio inglês e francês, passarei a comprar livros nessas línguas. Aliás, se o AO90 “pegar” pensarei seriamente em sair definitivamente do país.
Ainda não percebi o que pretende Artur Costa. Se é um defensor do acordês porque vem para aqui dizer, insistindo, que o “acordês é correto”.
Pode ser para si e para os que o aceitam. É evidente que para os apoiantes desta causa é incorrecto, digo mais, é uma aberração linguística.
Quanto ao artigo do Pedro Afonso, os meus parabéns. É com enorme satisfação que vejo os mais jovens repudiarem esta usurpação da nossa identidade que representa o AO90.
Os argumentos que apresenta são muito pertinentes e oportunos e apelam a uma qualidade que parece ter fugido do nosso país, o bom senso.
Oxalá consiga mobilizar mais estudantes para que resistam a esta aberração criminosa.
Ainda mais…nao é um desvario supor que num futuro, nesta guerra contra as nossas raízes, se continue com novos “acordos” para continuar a eliminar grupos consonânticos: imaginem nessa cedência grosseira à oralidade mais descurada palavras como *( ténica, anésia, eucalito, dútil, asorver, nemotenia, dianóstico…).
Pois uma das grandes mentiras do AO é negar o valor dessas letras ditas “mudas”, que em todo caso só se podem considerar assim numa pronuncia desleixada, coloquial ou desajeitada. Se os acordistas fossem coerentes, deveriam suprimir também sempre a letra H quando muda e escrever *Omero, *orizonte ou *erói; e já por poupar caminho, suprimir sempre as vogais mudas a escrever *qerer, *qiosqe, *tosqenejar (dito seja de passagem, isso seria o melhor que podiam ter feito) ou *qinaqina.
Enfim, o acordismo é uma cacografia que decalca o pior da cacofonia e abre o caminho para uma implosao deste acervo cultural que é a nossa Língua. Alicerça sobre a ideia de que quanto mais doado (=fácil) seja a aprendizagem, mais sucesso haverá nesta, o qual é um erro burdo que para nada se corresponde com a realidade ou a experiência. E faz isso ao preço de sacrificar o rigor, a lógica histórica, a herança etimológica e a identidade dos povos (no mínimo a de galegos e portugueses que partilhamos esta Língua)
Em suma, estamos ante uma eructaçao (ou será já *erutaçao) produto de um excesso de dieta coprófaga por parte de uma elite ao revés, o mais contrário ao senso grego da palavra ARISTOCRACIA. Estamos ante uma actuaçao ditatorial imposta com prepotência e violência por uma minoria de medíocres que parecem querer passar à história por algo destrutivo, visto serem incapazes de achegar nada construtivo. Para eles e para a sociedade que desejam construir, nao há melhor ilustraçom que este quadro de Goya (http://eeweems.com/goya/goya-pilgrimage-san-isidro.php). Reparem na cegueira do personagem que guia os romeiros (qual o destino de quem se deixa guiar por um cego?) e reparem na deformidade física nos rostos dos personagens, um clássico recurso de Goya para reflectir a fealdade espiritual.
Quero pedir desculpa a todos por ter uma opinião diferente. Já vi que o ambiente aqui é agreste, embora, salvo certos imbecis (vá lá, não sejamos cobardes: salvo o anónimo BIC laranja), tenha que saudar o espírito de liberdade. Aprendi a escrever de uma forma (tenho 50 anos), mudei, voltarei a mudar. Não sou demagogo como os que falam agora da língua dos seus pais ou dos seus avós, que era certamente diferente da de agora, na fala e na escrita. Permitam-me o desabafo: PQP. Falo como falo e escrevo como mandam os que fazem os dicionários e as gramáticas, que sabem mais do que eu. Não dou a importância que certa gente parece dar à coisa, não me aflige. A língua falada é do Povo, a escrita é das elites esclarecidas (ou não). Continuarei a dizer “baca” e a escrever “vaca”, a dizer “governo” e “governo”, conforme a sintaxe e o contexto. Nada de especial me atrai no AO 90, como nada de especial me atrai no que aqui parece ser o pilar fundamental da Pátria, o AO 1945. Não é por isso que sairei de Portugal, nem preciso de me vergar a galegos, angolanos ou brasileiros, irmãos em cultura e iguais em cidadania. O que não gosto é de ser insultado, explícita ou implicitamente.
Estudantes e Professores António Correia, visto que os Professores estão a aderir por medo.
@ Arthur Costa, #14
Será por ventura vossemecê da Invicta? Metteu-se-me esta scisma na cabeça sobre a relação de «invicto» com «vitória»; confesso-lhe que já procurei em «dicionários» e não achei nexo na disparidade de tais dicções. Não sei me entenderá mas é como escrevo… – Mas n’isto de o que escrevo alegrar analphabetos dou-lhe razão; veja o contentinho que vossemecê surge no commentario #14.
Cumpts.
@Jorge Teixeira: O que me entristece nesta traição das editoras, na sua falta de resistência, é que, nos tempos do Estado Novo, as editoras muitas vezes, sob o risco de multa, prisão, tortura, tinham a coragem de publicar escritores malditos, livros proibidas, tinham integridade, ética, espinha dorsal, e pouco proveito recebiam salvo uma consciência tranquila.
Agora, vivemos numa alegada democracia, as editoras certamente fazem mais dinheiro agora do que no tempo do Estado Novo, supostamente são mais independentes, mas o nível de subserviência é muito maior, o medo de desagradar enraizou-se, apesar de não haver forma de sofrerem quaisquer represálias por se recusarem a adoptar o acordo.
É repugnante esta falta de uma módica dose de coragem, e a pessoas assim não quero eu dar o meu dinheiro. Também eu continuarei a ler os livros anteriores a 2012, mas fora isso, é ler em estrangeiro. Aliás já enviei e-mails para a Leya e outros grupos, e recomendo que outros façam o mesmo, para que eles saibam que estão a perder leitores.
@Miguel: Também partilho essa mágoa.
@Artur Costa: não precisa de pedir desculpa pela sua opinião. Mas não vejo em que é que a sua opinião se distingue de se dobrar a brasileiros.
Quanto a escrever como mandam os dicionários, desculpe, mas está aí um primeiro equívoco. Os dicionários portugueses servem essencialmente para listar vocábulos e o seu significado, nas suas múltiplas grafias (inclusive as erradas mais comuns), de forma a que quando alguém se cruza com uma palavra que não conhece compreender o seu significado. Não deve desconhecer que são múltiplas as entradas dos dicionários assinaladas como vulgarismo, calão, brasil, corruptela, etc. Estas entradas nunca devem ser utilizadas no discurso escrito. Os dicionários portugueses (e brasileiros) não têm carácter normativo nem enciclopédico, não seguem a filosofia do dicionário de inglês de Oxford.
Quanto às gramáticas: faz muito bem, mas nenhuma delas se ocupa de ortografia.
Boa noite. Escrevo com a ‘antiga’ ortografia, e, à semelhança de um dos comentadores mais atentos deste fórum, também não consigo ler os livros que se publicam hoje em dia em acordês. Quanto aos tradutores, coitados, eles nada podem, i.e., se quiserem continuar a ter trabalho, embora conheça resistentes, naturalmente desempregados. E sim, são inaceitáveis os compromissos a que se dispuseram os editores desde a primeira hora. Mas lá está: tal como já não há quase livreiros, também quase não há editores, mas apenas funcionários dos grupos editoriais. E também quase não há pensamento crítico sobre tudo isto, mas apenas auto-designados especialistas da ‘coisa editorial’, comprometidíssimos com o marketing, esse remédio santo de aplicação universal que transformou o negócio dos livros numa actividade estranha à escrita e à leitura. Está tudo por terra, seria bom começar a construir, mas por onde se começa? Como se reverte o que aconteceu nas escolas com o ensino do Português? Vasco Graça Moura no CCB foi corajoso, mas quantos são capazes de como ele dizer NÃO? Quantos assinaram já a petição contra o AO?
@ A. Costa
Estive a ler todos os comentários até me decidir a comentar as suas lamentáveis intervenções, já que, como diz o povo, que foi posto de lado neste infame processo e não ordenou nada de nada, o que é de mais, é erro.
Vejamos o comentário nº 2
“Não vale a pena denegrir a causa dos que combatem sinceramente o Acordo usando demagogia, mentiras e ignorância, porque isso só vai desacreditá-los.
No seu caso, claro que há razões para certas confusões (entendo que será da Galiza e, por isso, as suas imprecisões são naturais).”
Não vejo em que o leitor visado esteja a denegrir a causa, a usar qualquer demagogia ou a mostrar qualquer ignorância… vossemecê é que o está a fazer com a agravante de ser português (será mesmo?), quando, o que devia, era enaltecer o lusismo do visado, qualidade que vossemecê não tem, de todo; imprecisões do leitor Bento? Mas já se enxergou ao espelho??? Maior que o universo….
No comentário nº 6, o leitor J. Gervásio coloca as coisas no seu devido sítio, ao aplaudir elegantemente um estrangeiro que é mais português, neste particular, que outros de BI diferente e que nem lá são mencionados, como vossemecê…e muito bem. No comentário 17 é vossemecê citado e é ver em que termos… Mas, burros é o que eles todos são, claro!
Comentário nº 11 de Bic Laranja
“Vossemecê diz que tanto intersectar sem «c» como interceptar sem «p» estão correctas sem «c»?… Deve ter apanhado reguadas que se fartou. E não se perdeu nenhuma.!”
O leitor Bic, deve ser um optimista, já que o que vossemecê diz, indica que, ou estudou no Brasil ou, mais provavelmente, nem à escola deve ter ido, ou então terá feito o 1º grau nas escolas de adultos e aí já não davam reguadas.
Comentário nº 14
“@ Bic Laranja
A sua escrita é fina. É mesmo a alegria dos analfabetos. Recomendo-lhe que consulte qualquer dicionário (atenção: não escreva diccionário…).
Depois de aprender alguma coisa, evitando desfigurar uma língua que, obviamente, não domina, venha escrever em público. Antes, tenha recato e respeite quem não conhece – a mim e a todos os que dão tanto valor ao Acordo de 1990 como ao de 1945. E aos linguistas que defendem o Acordo – tal como eu respeito os que o atacam, com argumentos sensatos e tecnicamente corretos, sem demagogia nem patriotismos balofos.”
A escrita de Bic Laranja é fina? Claro, pois se fosse Cristal era normal. E acho muito bem que ensine o citado a escrever numa língua que não domina (!!!), para ele não fazer figurinhas tristes em público, coisa que, ao que parece, o penaliza a si em extremo, e que aprenda a respeitar os outros como vossemecê diz que faz – é só ver onde estão concentrados os insultos neste verbete – e já que isso parece ser a sua especialidade, apesar de dizer mais abaixo que
– Falo como falo e escrevo como mandam os que fazem os dicionários e as gramáticas, que sabem mais do que eu…
Gostaria de saber como sabe que esses dos dicionários sabem mais do que vossemecê ( acertou, mas por pouco) e o leitor Bic Laranja não. É que, olhando à prosa deste, sou levado a supor que sabe bem mais do que esses dicionaristas que tanto parece apreciar; aproveito para lhe perguntar se se deu conta de que os dicionários de hoje não passam de repositórios de todas as asneiras que por aqui pululam? E isso, para si, é, pelos vistos, motivo de veneração que me dispenso de adjectivar… Valha-o Deus!
Ah! Já sei: é que ele pertence à classe de “certos imbecis (vá lá, não sejamos cobardes: salvo o anónimo BIC laranja)”
Linguistas que defendem o “acordo”? Quem são? Conhece algum? Eu sei de um: o que enche os bolsos com ele.
Por isso é que lhe recomenda que:
“Depois de aprender alguma coisa, evitando desfigurar uma língua que, obviamente, não domina, venha escrever em público”
Se o que diz não fosse de uma supina imbecilidade, era, no mínimo, cómico; mas será que não haverá nenhuma campainha de alarme nessa meia-dúzia de neurónios que lhe devem povoar o bestunto a adverti-lo para as calinadas que manda??? Mais uma vez, maior que o universo…
Deixo-o com uma frase que se lhe aplica em todo o seu (da frase e do seu) esplendor: (a adaptação é minha)
“A Europa não é cá. Mas há por aí uns que fazem que sim. Julgam-se arraçados de campinos; não passam de flexicabrestos, e, o que mereciam era um pampilho nos lombos ou mais uma garrochada na cernelha dos ditos animalejos.
Acho que se lhe aplica com toda a propriedade; adivinhe agora quem é o seu autor?
Cumprimentos
P.S. Melhor ainda que pedir desculpa aos leitores que amam a Língua Portuguesa e que aqui expressam esse amor com respeito e elevação ao ponto de o suportarem e lhe responderem, excepção feita ao Bic, pois claro, que a meu ver respondeu-lhe mas não o deve suportar, cito-o ( a si) pela última vez:
– tal como eu respeito os que o* atacam …
*= O “coiso”.
Vê-se!.