Mais do mesmo? Porquê? Para quê?

ARTVDe acordo com as notícias mais recentes, perfilam-se no horizonte, não uma, não duas, mas três RAR (Resolução da Assembleia da República) sobre o Acordo Ortográfico. A única que foi tornada pública até ao momento — o Projecto de Resolução n.º 890/XII/3.ª apresentado por deputados do CDS e do PSD — preconiza, resumidamente, o seguinte:

• Recomendar ao Governo a constituição de um Grupo de Trabalho que analise a possibilidade da efectiva aplicação do AO no espaço da CPLP até final de 2015.

• Recomendar ainda que, caso o Grupo de Trabalho considere não estarem reunidas as condições para a aplicação do AO, este mesmo GT proponha a revogação, suspensão ou revisão da Resolução do Conselho de Ministros (RCM 8/2011) que tornou efectiva a aplicação do AO para todos os organismos sob a tutela do Governo.

Ora, sobre este Projecto de RAR, temos que:

1) Sendo uma Resolução que resolve… recomendar, o Governo pode, desde logo, não acatar a recomendação.

2) Acatando-a, decorrerá certamente bastante tempo até que o Grupo de Trabalho se constitua e comece a trabalhar.

3) A este tempo, somar-se-ão os quatro meses de duração previstos para o Grupo de Trabalho, no pressuposto de que serão cumpridos os prazos.

4) E depois o tempo necessário para o accionamento de qualquer resultado desse trabalho (uma nova RCM? Com que efeito?).

5) Isto, claro, partindo do princípio de que haverá resultados. O Grupo de Trabalho poderá concluir que tudo está bem e a aplicação do AO no espaço da CPLP decorre dentro do previsto. Absurdo? Claro que sim — mas não é a saga do AO, toda ela, uma sequência interminável de absurdos?

6) Se não chegar a essa conclusão, o Grupo de Trabalho proporá então a “revogação, suspensão ou revisão da Resolução do Conselho de Ministros 8/2011” que efectivou a aplicação do AO.

7) Recomendação essa que, mais uma vez, o Governo não é obrigado a seguir.

8) Ora, tendo em conta que a RCM 8/2011 resulta da RAR 35/2008, aquela não iria na prática alterar alguma coisa, não iria revogar coisa alguma. Pelo contrário, esta “revogação, suspensão ou revisão” da RCM 8/2011 iria apenas referir-se a uma consequência da entrada em vigor do “acordo”, não à sua causa.

9) Ou seja, o Projecto de RAR apresentado pelos deputados Michael Seufert, Ribeiro e Castro e Mota Amaral atira para fora da A.R., através de simples “recomendações” e de medidas de resultado altamente incerto, a resolução de um problema que foi criado na A.R. e que só pode ser resolvido na A.R.

10) Porque não um Projecto de Resolução que, muito simplesmente, revogue a RAR 35/2008 — tal como preconiza, de forma igualmente simples, a ILC AO?

11) Para quê a criação de outro GT? O primeiro Grupo de Trabalho parlamentar sobre o AO90 foi pura perda de tempo? E então porquê? Porque terá sido assim?

12) Repetir tudo outra vez não resultará apenas, na prática, numa perda de tempo, permitindo que o AO se instale cada vez mais? Ou, pior ainda, numa forma de abrir a porta a que acordistas encontrem (isto é, inventem) pretextos para “rever” o aleijão?

Rui Valente

[Nota: estas observações (pessoais) dizem respeito ao único texto até agora publicado dos três projectos de RAR já anunciados pela comunicação social. Aguardemos pelos restantes.]

[Imagem de ARTV.]

 

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1 comentário

    • Jorge Teixeira on 7 Janeiro, 2014 at 11:10
    • Responder

    Isto é a táctica da lavagem ao cérebro: nomeiam-se grupos de trabalho sucessivos até que um deles conclua o que se pretende à partida (ou seja, que o AO90 é a melhor invenção desde o pão às fatias). Até lá é nomear novos grupos de trabalho.

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