Ex. ma Sr.ª Presidente da Assembleia da República
Considerando que:
– O Segundo Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990
(AO90) foi ratificado por Portugal em 2008, encontrando-se em vigor desde 2009 (com um período de transição até 2015) e implementado nos documentos oficiais e no sistema educativo, assim como em inúmeras publicações;
– A implementação do AO90 tem gerado uma grande variedade de dificuldades e de desafios, razão pela qual a Assembleia da República criou o Grupo de Trabalho para o Acompanhamento da Aplicação do Acordo Ortográfico, inserido no âmbito das actividades da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, tendo esse Grupo de Trabalho concluído a sua missão em Julho de 2013;
– Importa recordar o teor da Resolução da Assembleia da República n.º 23/2014, de 17 de Março, que recomenda ao Governo o acompanhamento da aplicação do Acordo Ortográfico em Portugal, lamentando que ainda não tenha sido implementada, uma vez que poderia constituir o contexto em que este e outros problemas poderiam ser convenientemente avaliados, em tempo oportuno e com sentido de equilíbrio;
– Foi noticiado que os alunos do ensino secundário que realizem exames nacionais no actual ano lectivo serão sujeitos a fortes penalizações na sua avaliação caso não utilizem a grafia imposta pelo AO90, situação que provocou o alarme e a indignação de alunos e de suas famílias. De facto, o AO90 não foi verdadeiramente aceite pela generalidade dos portugueses,sendo frequentemente alvo de polémica, pelo que a sua aplicação em exames nacionais coloca legítimas dúvidas;
– A verificar-se essa opção por parte do IAVE e do Ministério da Educação e Ciência, trata-se de uma injustiça, tendo em conta que muitos dos alunos candidatos a exame apenas tiveram contacto escolar com a nova grafia recentemente, muito após a sua aprendizagem nos primeiros ciclos do ensino básico, e a penalização em exames nacionais pode ter uma influência negativa no acesso a determinados cursos no ensino superior. Além disso, fora do contexto escolar, predomina ainda a grafia anterior ao AO90, com a qual esses alunos contactam diariamente.
Mais ainda, não está elaborado um Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa, que permita aos alunos o acesso a recursos oficiais comuns para aplicação das regras ortográficas.
Assim:
Tendo em conta o disposto no artigo 156.º, alínea d) da Constituição, e as normas regimentais aplicáveis, nomeadamente o artigo 229.º do Regimento da Assembleia da República, cujo n.º 3 fixa em 30 dias o limite do prazo para resposta;
O(a)s Deputado(a)s do CDS-PP, abaixo-assinados, vêm por este meio requerer ao Ministro da Educação e Ciência, por intermédio de Vossa Excelência, nos termos e fundamentos que antecedem, respostas às seguintes perguntas:
1 – Confirma que, no âmbito da avaliação dos exames nacionais do ensino secundário,será considerada como erro e assim penalizada a utilização da grafia anterior ao AO90?
2 – Se sim, a mesma medida será aplicada em algum outro ciclo ou grau de ensino?
3 – Se sim, havendo professores que são objectores de consciência contra o AO90, como será atribuída aos professores a responsabilidade de corrigir os exames nacionais?
4 – Se sim, existindo tantas incertezas e informações contraditórias acerca do AO90, assim como inúmeras excepções às palavras que por ele são alteradas, como se irá garantir a uniformidade de critérios na correcção?Palácio de São Bento, terça-feira, 7 de Abril de 2015
Deputado(a)s
MICHAEL SEUFERT(CDS-PP)
JOSÉ RIBEIRO E CASTRO(CDS-PP)
ABEL BAPTISTA(CDS-PP)
INÊS TEOTÓNIO PEREIRA(CDS-PP)
[Transcrição de documento publicado no “site” da Assembleia da República em 8.04.15. Os “links” e destaques são nossos.]
Documento anterior com o mesmo título, de outros deputados, AQUI.
2 comentários
Será que está amostrazinha de indignação vai ter eco?… Lamento profundamente afirmá-lo, mas duvido. Há demasiados anos que o Ex-M.E. se enquistou e se comprova relapso, inculto, ineducável, esclerosado.
E havemos de morrer com este desgosto? Esta língua matricial tão bonita há-de continuar a ser violada pelo inimigo? Tivessem estes bárbaros lido “Le Silence de la Mer”, de Vercors, saberiam que há legados que é preciso acarinhar. As palavras de uma língua são pequenas hastes de um ninho, estão interligadas, entretecem-se, criam laços, acalentam. Ter vivido num outro país e reconhecê-las num qualquer corredor, numa rua estranha, escrita em paredes, sussurrada em igreja com volutas de incenso ou gritada em novelos de fúria é voltar a casa. É já estar em casa. É a casa acolher-nos.
E havemos de nos sentir estrangeiros no nosso próprio solo? Que estigma, que praga, que tumor é este que se metastiza em tudo o que aparece escrito em todos os suportes? Eu, sinto-me cuspida, irreconhecida, desmerecida. Ver a Língua escorrer, assim arranhada e gasta, dorida e de cabeça rapada pelas ruas, só me lembra as francesas que “dormiram com o inimigo”… Que raio de país é este, narcoléptico e prostituído? Esta “nova língua” dói no pensamento. A alma, essa, já está de luto mal se abre um livro, aquele que era o lugar utópico para se morar quando tudo o mais falhava. As bibliotecas já não moram no meu peito, são agora catedrais decrépitas, escombros onde mora o erro, onde como heras cresce a falácia, onde muito do que aprendi e ensinava são agora máculas, desconchavos e mágoa. Leio o que está torto e torturo-me, como as bailarinas atormentadas das coreografias de Bausch. A “nova língua” faz-me pesadelos, é uma dentição onde, em vez das pérolas que descrevia Camões, vejo uma meretriz desdentada de Brueghel, o Velho. Um ultraje. Uma nódoa. Dizem bem os franceses: “C’est un comble!…”. É o cúmulo. O meu povo é anedótico. O meu país já não existe, o que me torna apátrida. Isto é apenas uma parte do que sinto, desdobrada entre 99% de desespero (terei de ensinar erros aos meus alunos?…) e 1% de sebastianista crédula e crente (ainda haverá alguém que…?). Agora, as palavras conseguem doer-me, anímica e fisicamente. Cura para as palavras doentes, precisa-se. Urgentemente. Porque se acorda e os olhos abrem-se para vidro moído que lhes é atirado. Como é óbvio, não se dão alvíssaras, mas pede-se o impossível: devolvam-nos o que nos tiraram!
Depois de (alguns) deputados do PSD, eis que (alguns) deputados do CDS questionam este novo abuso relacionado com o «(des)acordo ortográfico». Só lhes fica bem… e demonstram que nem todos seguem sempre e acriticamente as lamentáveis lideranças dos seus grupos par(a)lamentares. Agora, é esperar para ver se nos partidos mais à esquerda existirão iniciativas semelhantes.