Depoimento da Doutora Isabel Pires de Lima, ex-Ministra da Cultura, ex-Deputada, professora catedrática da FLUP, em audição no Grupo de Trabalho parlamentar sobre o AO90, no dia 06.06.13.
Vídeo produzido por ARTV, Canal Parlamento, alojado no endereço
http://srvvideo2.parlamento.pt/videos-canal/XII/SL2/02_com/08_cecc/20130606cecc.wmv
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Saúdo o desassombro com que recomenda que se desista do AO90. Lamento que o não tenha conseguido quando era Ministra.
É de lamentar também o triste espectáculo oferecido pelos deputados que tentam defender o indefensável.
De facto, as perguntas feitas, em especial pela deputada Canavilhas, procuram defender o acordo atacando quem presta o seu contributo ao grupo de trabalho. Cada cabeça sua sentença, dizia, como que dizendo você pode apresentar bons argumentos, mas a decisão está mais que tomada. Agradecemos o seu contributo, mas agora podemos fingir que ouvimos todas as partes.
A Doutora Isabel Pires de Lima bem apontou a principal falha do acordo, a fragmentação do que era uno (descontando o Brasil que sempre desrespeita os acordos). Temos um Português no Brasil, temos outro, que era nosso em África e Timor e por cá temos pelo menos meia-dúzia, entre o oficial e as várias interpretações das facultatividades.
Que grande passo para a Nação!
Clara e convicta argumentação, vinda de uma especialista de estudos literários e culturais, conhecedora do valor da língua portuguesa, “matéria-prima” da literatura. E com responsabilidades políticas, visto que foi Ministra da Cultura no início do 1.º governo de José Sócrates (de 12 de Março de 2005 a 29 de Janeiro de 2008) e deputada pelo PS.
Vale a pena ouvir, mas desde já destaco alguns aspectos essenciais desta intervenção:
– Recordou a sua discordância em relação à ratificação do II Protocolo Modificativo, sem discussão prévia, e a sua posição a favor de uma moratória de dez anos, com vista à revisão do AO90, tendo ainda salientado que entre 1990 e 2008 não foi conseguido o vocabulário comum, particularmente no que se refere às terminologias científicas e técnicas.
– Não é com acordos ortográficos (baseados no “logro” da facilitação fonética da ortografia) nem por decreto que se faz a internacionalização da língua, mas sim pelos conteúdos que ela for capaz de veicular. Com este acordo, o mercado do livro tornar-se-ia mais fácil para a indústria editorial brasileira, tornando mais difícil a circulação dos conteúdos culturais portugueses.
– O AO90, cientificamente muito deficiente e, por isso, de aplicação impossível, elaborado há mais de 20 anos, tendo apenas em conta Portugal e o Brasil, revelou-se um factor de desagregação: rompeu-se a coesão que havia entre Portugal e os outros seis países de língua oficial portuguesa e não se unificou nada, antes se aumentaram as permissividades e as facultatividades, inclusivamente no interior do mesmo território linguístico! É a negação do próprio conceito de ortografia! No espaço intercontinental da língua portuguesa escrita, há neste momento três normas, com Portugal a avançar na deriva ortográfica. “O futuro veio a confirmar os piores receios”!
– Impõe-se, portanto, um “gesto patriótico”: é preciso repensar, travar este processo, salvaguardar o bem cultural chamado língua portuguesa!
Parece-me assim evidente que há no PS duas correntes relativamente ao AO90, esta que aqui se exprime e a que está representada no Grupo de Trabalho pela Sr. Deputada Gabriela Canavilhas, aliás na linha do Ministro da Cultura a quem sucedeu, José António Pinto Ribeiro.
Quanto ao Sr. Deputado Luís Fazenda, pela sua displicente e rápida intervenção,
pareceu-me adepto da obsolescência ortográfica programada…
Cito de memória:
“Creio que há um consenso muito alargado quanto à necessidade de revisão de vários aspectos do AO. Eventualmente, porque isto tem um tempo de uma semi-eternidade, será uma tarefa para a próxima geração. Mas lá iremos…”