35 000 assinaturas «é absurdamente desproporcionado» [PCP]

A consagração do direito dos cidadãos apresentarem iniciativas legislativas junto da Assembleia da República constituiu, em si mesmo, um passo de grande significado na efectivação de um importante mecanismo de participação dos cidadãos na vida política, consubstanciando de igual modo um importante elemento de aproximação entre os cidadãos e o Parlamento que os representa.

(…)

Nas diversas iniciativas legislativas que apresentou sobre esta matéria, o PCP sempre considerou adequado o número mínimo de cinco mil cidadãos eleitores para apresentar uma iniciativa legislativa à Assembleia da República. Já então, uma petição apresentada à Assembleia da República subscrita por quatro mil cidadãos era obrigatoriamente debatida em plenário. Dificilmente se compreenderia uma solução de tal modo exigente para a iniciativa legislativa popular que inviabilizasse na prática a sua utilização pelos cidadãos.

A solução aprovada, porém, teve esse efeito indesejável. Ficou provada a exigência de 35.000 assinaturas de cidadãos eleitores para apresentar uma iniciativa legislativa à Assembleia da República. O que é absurdamente desproporcionado e torna quase inviável qualquer iniciativa. Repare-se: A Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, exige que a iniciativa legislativa de cidadãos seja subscrita por 35.000 eleitores, indicando o respectivo número de bilhete de identidade e de cidadão de eleitor, podendo ainda a Assembleia da República confirmar por amostragem a sua autenticidade. Entretanto, com 7.500 assinaturas pode constituir-se um Partido Político ou apresentar uma candidatura à Presidência da República.

Não se trata de equiparar iniciativas que são diferentes. Trata-se apenas de chamar a atenção, recorrendo a alguns exemplos comparativos, para a falta de proporcionalidade da exigência de 35.000 assinaturas para a apresentação de uma iniciativa legislativa de cidadãos. O PCP não preconiza um grau de exigência que pudesse banalizar a apresentação de iniciativas legislativas de cidadãos, mas a exigência de 5.000 assinaturas parece adequada, tanto mais que não se trata de impor a aprovação do que quer que seja à Assembleia da República. A única obrigação que decorreria para o Parlamento seria a apreciação da iniciativa, já que a sua aprovação ou rejeição seria unicamente da competência da Assembleia da República enquanto órgão de soberania. Por outro lado, não se deve esquecer que a apresentação de iniciativa legislativa implica um grau de exigência, na sua elaboração, muito superior ao da apresentação de uma petição, representando assim um grau de participação cívica que deve ser incentivado e não desencorajado.

Aliás, a prova de que a exigência de 35.000 assinaturas quase inviabiliza a apresentação de qualquer iniciativa está no facto de apenas uma iniciativa ter sido apresentada desde 2003 até à data, apesar de por diversas vezes, grupos de cidadãos terem manifestado tal intenção. Só que, perante um grau de exigência tão inacessível, acabam por ter de recorrer unicamente ao exercício do direito de petição não se responsabilizando directamente pela proposta de uma solução legislativa para as suas pretensões.

Com o presente projecto de lei, o Grupo Parlamentar do PCP pretende contribuir para que o direito de iniciativa legislativa de cidadãos, deixe de ser um princípio inacessível e passe a ser um direito concretizável.

Com isso ganhariam os cidadãos, ganharia o Parlamento e ganharia a democracia.

Entretanto, serve também a presente iniciativa para actualizar o regime legal vigente para a iniciativa legislativa de cidadãos em face da extinção do cartão de eleitor, deixando de exigir o número de cartão de eleitor aos subscritores das iniciativas, bastando tão só para o efeito a menção ao número de identificação civil.

[Transcrição parcial do Projecto de Lei Nº 85/XII, apresentado pelo Partido Comunista Português, sob a designação «Primeira Alteração à Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho». Destaques, sublinhados e inserção de links de nossa autoria.]

Ver situação deste Projecto de Lei AQUI.

Ver “post” sobre um Projecto de Lei similar, do PEV, AQUI.

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1 comentário

  1. Estes enfeites democráticos ficam-lhes bem desde que não agitem muitas águas. Não viram os srs. deputados o exagero logo em 2003? A II.ª parte do parecer da C.P.D.L.G. dá a entender, pelo meio das desculpas, que não são assim tão ceguetas. Mas adiante. A fasquia de 5.000 assinaturas parece medida mais justa. Se o projecto fosse aprovado em seus termos simples seria melhoria de vulto na sacrossanta democracia. Só que lá está; os rodriguinhos soprados na II.ª parte para a tramitação dos projectos de lei de iniciativa de cidadão não são mais que escolhos para peneirar o que se queira antes de chegar ao plenário. – Uns fidalgos, estes deputados; estão lá eles para aturar o povo!… – A ver se não ficamos pior, com qualquer desqualificada comissão empossada com direito de veto sobre iniciativas… impertinentes.
    Cumpts.

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