AO90 «É língua política, não política da Língua» [Paulo Rangel, “RDP”, 18.05.15]

 

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Aquilo que realmente aqui importa ter em atenção é que o “acordo ortográfico” já vem dos anos 90, agora foi imposto definitivamente nas escolas  (os alunos que não escreverem segunda a nova regra, no fundo, passarão a estar a errar e portanto serão penalizados nos seus exames e nos seus testes por essa circunstância),  mas este “acordo ortográfico”, que pretendia unir todos os países de falantes de Português, na verdade só está em vigor em Portugal; quer dizer, não está no Brasil, onde não foi levado avante, não está em Angola e não está em Moçambique, para falar, no fundo, daqueles três países que aqui poderiam “contar”, do ponto de vista da população e da sua importância futura. E portanto, no fundo, isto não é um “acordo ortográfico, isto é uma “norma ortográfica” puramente para o continente europeu. Qual é o problema, aqui?  É que isto, basicamente, é uma língua política e é muito mau misturar política e Língua. Portanto, não compreendo como é que o Governo continua a insistir neste erro, que aliás já vem de vários governos anteriores, não sei o que é que se passa na “5 de Outubro“, de cada vez que chega lá um Ministro acaba por se deixar deslumbrar pelo “acordo ortográfico”,  mas o que eu acho que isto revela é que em vez de nós termos uma política da Língua temos uma Língua politizada e uma língua política. Repare: não tem sentido nenhum, o “acordo ortográfico”; ele retira-nos das nossas raízes, que são as raízes do Latim, em particular; afasta a Língua, hoje, de um conjunto de… para estrangeiros que estudam Português torna-se muito mais difícil porque nós estamos cada vez mais um pouco com a norma italiana, que é uma norma puramente ortográfica e que não tem a ver com as raízes das palavras, que nos permitiam identificá-las, no Inglês, no Francês, no Espanhol, ainda Rui Ramos recentemente chamou a atenção para isso,  e portanto temos esse problema. Há um outro aspecto que me parece que é lamentável também, aqui, que é o aspecto de, no fundo, nós sairmos cada vez mais da busca dos Clássicos, do Grego, do Latim, que seriam fundamentais para a aprendizagem das nossas crianças e que eu lamento imenso que estão completamente abandonados, nomeadamente o Latim – em Portugal – está numa situação que não tem paralelo nos outros países da Europa,  como Língua estrangeira (embora uma Língua morta mas fundamental para a compreensão do Português), e na verdade isto representa muitas outras coisas; eu lembro que, no início, este Governo, enfim, de que eu sou apoiante, como é sabido, chegou a pensar eliminar a segunda Língua, nomeadamente o Francês; quer dizer, o que é uma coisa que não tinha sentido absolutamente nenhum, portanto, a segunda Língua estrangeira, digo eu; portanto, eu acho que, sinceramente, nós temos neste momento, depois do exemplo que foi dado na semana passada, língua política a mais e política da Língua a menos.  E portanto eu pedia que, agora, que vamos entrar em período eleitoral, os Partidos pensassem bem numa política da Língua, que acabassem com este disparate que foi o “acordo ortográfico” e que pensassem [inaudível]  na política para segundas Línguas estrangeiras, para além do Inglês.  Acho que era fundamental que num país como Portugal, que é um país europeu, periférico, os nossos alunos têm capacidade multi-linguística; isso fará uma diferença enorme no futuro a favor deles. E portanto seria oportuno pensar no Português, pensar no Inglês e pensar nas restantes Línguas que nós temos de falar. Eu prefiro política da Língua a Línguas politizadas, a línguas políticas.
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[Declarações de Paulo Rangel, deputado do Parlamento Europeu, no programa Conselho Superior (RDP – Antena 1) emitido em 18.05.15. ]

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