«O Acordo ortográfico e a iliteracia» [Duarte Afonso, “Jornal da Madeira”, 08.02.15]

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ARTIGO | | POR DUARTE AFONSO

Passados alguns anos após a entrada em vigor do acordo ortográfico, importa reflectir na utilidade desse monstro.

Antes porém, vale a pena recordar o que foi escrito no preâmbulo do mesmo: “O projecto de texto de ortografia unificada de língua portuguesa aprovado em Lisboa em 12 de Outubro de 1990, constitui um passo importante para a defesa da unidade essencial da língua portuguesa e para o seu prestígio internacional”.

Ao contrário da unificação como afirmam os autores do acordo, a desunificação é total e a trapalhada não tem fim.

Há uns jornais que escrevem de acordo com as regras anteriores e outros em consonância com o monstro. Há textos escritos com e sem o acordo. Há zonas cinzentas onde se mistura tudo.

Agora, temos o português correcto que é o que se escreve em Angola, o português brasileiro, e o acordês, que é a trapalhada que se escreve em Portugal.

Na nota explicativa do acordo está escrito o seguinte: “Casos de dupla grafia (base IV)”. “Admitem as duas alternativas: cacto e cato, caracteres e carateres, dicção e dição, facto e fato etc.”

Por um lado, falam em texto de ortografia unificada. Por outro, impõem a dupla grafia. Os autores de tão iluminada trapalhada, deviam saber que a dupla grafia não une, afasta, que é bem diferente.

Outra trapalhada.

“Não se emprega em geral o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa.) Sirvam, pois, de exemplo de emprego sem hífen as seguintes locuções:” “Substantivas: cão de guarda, fim de semana, sala de jantar”. “Adjetivas: cor de açafrão, cor de café com leite, cor de vinho”. (Base XV).

A palavra fim-de-semana não é consagrada pelo uso?! Esta é de bradar ao céu. E como é que os autores do acordo chegaram à brilhante conclusão, que a palavra cor-de-rosa é mais consagrada pelo uso do que a palavra cor-de-vinho? Com moeda ao ar?

Mais uma pérola literária.

Na nota explicativa, (5-2-4 está escrito: “Considerando que tais casos se encontram perfeitamente delimitados Optou-se por fixar a dupla acentuação gráfica como a solução menos onerosa para a unificação ortográfica da língua portuguesa”.

Neste caso, os autores do acordo não souberam interpretar o que escreveram. A dupla grafia não une, afasta, e significa o contrário daquilo que defendem. Isto tem um nome: Iliteracia. Estes factos revelam bem o que é o monstro

Já é tempo de acabarem com o acordo ortográfico, porque é um verdadeiro crime contra o património cultural português.

Refira-se ainda que o mesmo é ilegal porque ainda não foi elaborado o vocabulário ortográfico comum a todos os Estados signatários, como impõe o próprio acordo. Além disso, Angola não o ratificou nem vai ratificar.

O Estado não tinha nem tem o direito de legislar sobre matérias que dele não dependem, nem a ele competem, como é o caso da nossa língua em qualquer das suas vertentes, sendo a ortografia uma dessas vertentes.

Ao longo do tempo sempre foram feitos ajustamentos na nossa língua, mas foram feitos com rigor, por especialistas competentes, e não com acordos inúteis e prejudiciais para o nosso país, nem com leis nem decretos.

Este governo pouco mais tem feito do que impor austeridade ao nosso Povo, massacrá-lo com impostos, fechar escolas, tribunais, centros de saúde, baixar salários aos funcionários públicos, aos trabalhadores e baixar a pensão a reformados e pensionistas.

Apesar do muito dinheiro que tem saído dos bolsos dos contribuintes, falta para quase tudo. A cultura está a morrer lentamente por ter sido abandonada.

Na Madeira, felizmente, o Dr. Miguel Albuquerque já disse claramente se for eleito para o próximo governo, a cultura será a principal prioridade.

Estou convicto que assim será, porque o Dr. Miguel Albuquerque, homem de saber, de leis e de letras, já enfrentou grandes tempestades, acalmou águas revoltosas, e deu provas mais que suficientes de ser um bom timoneiro para conduzir a Madeira por rotas calmas e seguras.

[Transcrição integral de artigo, da autoria de Duarte Afonso, publicado no jornal “Notícias da Madeira” em 08.02.15. “Links adicionados por nós.]

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