«O ilegal, inútil e ridículo AO90» [Octávio dos Santos vs “Pris”, correspondência]

meuselonAO1
——— Forwarded message ———-

From: Octávio dos Santos
Date: 2014-04-03 0:46 GMT+01:00
Subject: Re: «Os Jogos da Fome»
To: Pris Geral geral@pris.pt
Caro(a) ???????

antes de mais, creio que é – que seria – da mais elementar boa educação identificar-se, assinar a mensagem que me enviou… não o tendo feito, pouco mais é do que um anónimo – e de certeza não quer que eu acredite que a empresa Pris tem uma personalidade e uma mente próprias…

Vou desde logo direito ao cerne da questão. Escreveu você que «gostando ou não do acordo ortográfico, somos obrigados a utilizá-lo». Não, não são: para além de inútil, prejudicial e ridículo, o AO90 é ilegal, tanto externa como internamente; resulta de um tratado internacional que não foi ratificado por todos os países signatários, mais concretamente Angola e Moçambique – logo, não está em vigor; e, em Portugal, está a ser imposto com base numa resolução da assembleia da república… que é juridicamente inferior, obviamente, a um decreto (de 1945) que estabelece como única ortografia válida… a definida antes do AO90. Tudo isto são factos… e, sim, «facto» escreve-se ainda com «c», mesmo com o «acordo».

De qualquer modo, mesmo que fosse legal, o AO90 seria sempre ilegítimo; é uma intervenção inadmissível e leviana, por parte do Estado, numa área – a Cultura – que deveria estar resguardada de caprichos e de devaneios burocráticos e políticos. E desde quando é que todas as ordens são para serem obedecidas? Você faz tudo aquilo que lhe mandam? Não tem vontade própria? Não pensa por si? Na administração central e local os funcionários são coagidos a adulterar a ortografia sob risco de serem punidos, sancionados – insólita situação quando se celebram os 40 anos do 25 de Abril de 1974. Na sociedade civil, nas empresas privadas (como a Pris), nada há – repito, NADA! – que vos (nos) obrigue a escrever deste modo.

Se o vosso objectivo é efectivamente «a máxima satisfação dos nossos (vossos) consumidores», então respeitem-nos na sua diversidade de perfis e de preferências. Se têm os meios, as ferramentas, as possibilidades técnicas de disponibilizarem o máximo de legendas em diferentes línguas… então façam-no. De contrário, estarão a diminuir o vosso mercado potencial, os clientes que poderão atrair. Eliminar a liberdade de escolha, restringir as opções a uma só… é típico do passado, de uma mentalidade atrasada. Como, aliás, qualquer tentativa de «unificar a ortografia». Se tiver oportunidade, pergunte aos seus contactos nos EUA e na Grã-Bretanha – da LionsGate e de outras empresas que representam – o que pensariam de uma eventual «ortografia inglesa única». Aposto em como a resposta seria o riso.

Octávio dos Santos

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2014-04-01 16:09  GMT+01:00 Pris Geral geral@pris.pt

Exmo. Octávio dos Santos.

Antes demais agradecemos o seu interesse pelas nossas edições, e demos o devido tratamento à sua reclamação.

Gostaríamos de informar que a prioridade na elaboração das nossas edições é a máxima satisfação dos nossos consumidores, sabendo que muitas vezes não é possível agradar a todos eles dado que isso nos obrigaria à existência de uma enorme e complexa variedade de edições.

Nos títulos como o Hunger Games procuramos sempre ter uma diversidade de edições que permita ser ajustada aos vários consumidores. No lançamento do Hunger Games – Jogos da fome, tivemos edições especiais com oferta de Colar, edições especiais com 2 discos, e tivemos para ambos os formatos, DVD e Blu-Ray.

Relativamente ao lançamento do Hunger Games – Em chamas, tivemos também a preocupação de termos edições que fossem de encontro as exigências do mercado, criando edições com oferta de postais, edições repletas de material de bónus, edições DVD e Blu-ray, etc.

No que diz respeito ao uso do acordo ortográfico, informamos que é uma obrigatoriedade imposta pelas produtoras. Os nossos produtos estão dessa forma, a não ser que exista algum erro de tipografia ou ortográfico. Gostando ou não do acordo ortográfico somos obrigados a utilizá-lo.

Por norma todas as nossas edições PRIS, no material de bónus existente tem as legendas em português “trancadas”, ou seja obrigatórias. Pode existir um ou outro caso em que isso não aconteça, como por exemplo no Hunger Games – Jogos da Fome, dado ter sido excecionalmente, uma produção centralizada.

Informamos também que essa mesma situação de ter a legenda em português obrigatória no material de bónus está neste momento em análise, muito devido ao fato de existirem consumidores que não se reveem muito no novo acordo ortográfico, e assim sempre podem ver os material de bónus na sua forma original. Mas essa situação como referimos está em análise.

Esperamos ter respondido às suas questões, e reforçamos que tentamos sempre ir de encontro com as expectativas dos consumidores.

Com os melhores cumprimentos

Pris, Audiovisuais SA

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De: Octávio dos Santos
Enviada: sábado, 29 de Março de 2014 16:56
Para: geral@pris.pt
Assunto: Re: «Os Jogos da Fome»

Cara Sofia Augusto,

contacto-a, e à Pris, novamente, para informar de que, afinal, a situação é ainda mais grave… Se no filme ainda é possível «desligar» as legendas em «acordês», o que fiz para não ser incomodado com a leitura de idiotices, nos «extras», nos documentários – que eu gosto sempre muito de ver também – não foi possível fazer isso… o que é algo de inadmissível. Por isso, lá tive de aturar diversos «ator», «atriz», «aspeto», «ótimo» e até «espetro», entre outras anormalidades.

Estou decidido a contactar a Lionsgate e a fazer-lhe queixa do vergonhoso «trabalho» feito pela Pris com a edição do filme em Portugal. Fazê-lo ou não, e o modo como o farei, dependerá muito da vossa resposta.

Cumprimentos,

Octávio dos Santos

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2014-03-25 17:09 GMT+00:00 Octávio dos Santos

Cara Sofia Augusto,

no seguimento da nossa conversa por telefone desta manhã, e tal como combinado, envio esta mensagem à Pris para perguntar por que motivo, na edição em vídeo (Blu-Ray/DVD) para Portugal do filme «The Hunger Games – Catching Fire», só há legendas em «português» – e as aspas justificam-se porque, com o ilegal, inútil e ridículo «acordo ortográfico», não se trata de verdadeiro português. Aliás, no filme anterior (e primeiro da série), «The Hunger Games», também editado no nosso país pela Pris, existem legendas em inglês. Porquê, portanto, esta diminuição de qualidade, e de alternativas, de um filme para outro?

Obrigado, e cumprimentos,

Octávio dos Santos

http://octanas.blogspot

[Esta troca de correspondência entre o jornalista Octávio dos Santos e a empresa “Pris – Audiovisuais” foi-nos enviada pelo próprio para efeitos de divulgação.]

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1 comentário

    • Maria Barbosa on 4 Abril, 2014 at 8:59
    • Responder

    Antes “de mais” e depois de alguma coisa, útil seria também aconselhar essa empresa a oferecer aos seus colaboradores formação básica de Língua Portuguesa, para que a aplicação da ferramenta não envenenada vá, de facto, “de encontro” ao AO90 e … “CATRAPUS”, o faça cair de vez! … ao invés de “ir ao encontro” da insensatez, ilegalidade, castração e corrupção do nosso património linguístico, como se tem verificado continuamente.

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