A nova vida da ILC

RRAR071212mNa passada quarta-feira a Assembleia da República aprovou, por unanimidade, algumas alterações à Lei que rege as Iniciativas Legislativas de Cidadãos (Lei 17/2003, de 4 de Junho). Salientamos, desde logo, a redução do número de assinaturas necessário para a realização de uma ILC, que passa de 35.000 para 20.000.

Mas a alteração mais importante é, sem dúvida, a que irá permitir a recolha de assinaturas por via electrónica.

A ILC pela revogação do Acordo Ortográfico sempre enfrentou os mais variados obstáculos — a começar pela luta que nos foi movida pelos acordistas. No entanto, a grande barreira, que nunca conseguimos verdadeiramente ultrapassar, foi a da obrigatoriedade da apresentação das subscrições em papel.

A ILC-AO foi vítima, até aqui, do anacronismo de uma Lei. Em plena era digital, quando todos nos habituámos à facilidade do envio de um e-mail, a Lei 17/2003 obrigava-nos a imprimir um papel, a preencher um envelope e a ir aos correios.

Num contexto difícil, sem meios logísticos e humanos dignos desse nome, apenas com a colaboração voluntária de entusiásticos defensores da Língua Portuguesa, não deixa de ser surpreendente que, ainda assim, mais de quinze mil pessoas tenham respondido ao nosso apelo.

Sendo um número que nos enche de orgulho, 15.000 assinaturas eram insuficientes para validar a ILC na Assembleia da República. Sem perspectivas e sem condições para reunirmos as assinaturas restantes, parámos formalmente a recolha de subscrições.

Agora, o cenário é diferente: com os novos limites, as assinaturas já recolhidas deixam-nos muito perto do nosso objectivo. Com a vantagem acrescida de podermos, a partir de agora, recolher as restantes assinaturas por via electrónica, através da Internet.

Neste novo cenário, todos nós, militantes da ILC, sentimos que é chegada a hora. Temos a obrigação, o direito e o dever de levar esta nau a bom porto. Devemos isso a todos quantos subscreveram a iniciativa em papel, e confiaram em nós para fazer chegar a sua voz à Assembleia da República. E, acima de tudo, devemos isso à Língua Portuguesa.

O que é que muda? O essencial, mantém-se. A ILC é obviamente a mesma.

Mas passemos em revista algumas alterações que devem ser explicadas.

A primeira mudança tem que ver com o nosso posicionamento perante a Comissão Nacional de Protecção de Dados. Até aqui a ILC apenas recolhia e contava subscrições. O tratamento dos dados constantes no boletim de subscrição não era necessário e, como tal, não era feito. A partir de agora, atendendo à própria natureza digital do processo, toda a informação irá ser tratada, incluindo a que foi (e vier a ser) recolhida em papel. Isto significa que iremos finalmente poder responder à pergunta “pode dizer-me se já subscrevi a ILC?”

RV_assinaturasILCMuda o “fiel depositário” das subscrições já recolhidas. Num gesto de confiança que espero saber merecer, o João Pedro Graça, 1º subscritor da ILC e o seu principal impulsionador, entregou-me, no mesmo dia em que as alterações à Lei das ILC foram aprovadas na AR, todos os impressos já recolhidos. Não é uma responsabilidade pequena — veja-se o comentário de uma subscritora sobre a própria assinatura: “quando fui ao correio enviar o meu impresso, era como se levasse um tesouro nas mãos. Isto não é uma luta… É uma exigência (no sentido de necessidade imperiosa) de defender o que de mais sagrado tem um povo: a língua pela qual expressa toda a sua forma de sentir e pensar!”… no momento em que assumo esta tarefa não posso deixar de agradecer publicamente ao João Pedro Graça — pela confiança demonstrada e pelos longos meses em que assumiu ele mesmo, sozinho, essa responsabilidade.

IMG_5056Aqui vemos os impressos já depositados na sua nova casa, em Coimbra. Nos termos da Lei da Protecção de Dados, qualquer assunto  referente a estas subscrições (consulta, verificação presencial, etc.) deverá ser tratado comigo: Rui Valente.

Outra mudança visível prende-se com a nossa “casa” virtual. Este site (www.ilcao.com) existe já há alguns anos mas tem funcionado até aqui apenas como site alternativo e de “backup” do site original (tantas vezes alvo de ataques cibernéticos). O www.ilcao.com Irá conservar todos os conteúdos históricos do site original mas, a partir desta data, passará a ser o nosso site principal. Será aqui que iremos introduzir a página com o formulário de subscrição da ILC, que poderá ser preenchido online, e será também aqui que continuaremos a dar todas as informações sobre a ILC e sobre a luta contra o AO.

Acima de tudo, muda o nosso estado de espírito. Permitam-me uma pequena nota pessoal: o dia 19 de Junho de 2015 (dia do “fim” da ILC) foi para mim um dia de desespero. Desde então, ao longo de treze tristes meses, a luta contra o AO pareceu estar perdida. Durante mais de um ano, pouco mais pude fazer do que resmungar, impotente, contra o desconchavo ortográfico que se instalou no nosso país. Agora, tudo muda — é por demais evidente que esta luta ainda não acabou. Desde logo, as razões para recusarmos o AO continuam intactas, senão mesmo reforçadas pela prática desastrosa que tem sido a implementação do Acordo. E, com o novo cenário legislativo das ILC, voltámos a ter, na nossa mão, as ferramentas necessárias para tirar a Língua Portuguesa do cAOs absoluto em que alguns a meteram.

 

 

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10 comentários

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    • Luís Afonso on 25 Julho, 2016 at 10:40
    • Responder

    Deduzo, pelo que escreveu, que as anteriores subscrições não perderam validade e que quem subscreveu inicialmente a ILC em papel não precisará, nem deverá, subscrevê-la novamente por via electrónica.

    É assim? Obrigado pela resposta e pelo relançar da iniciativa.

    Cumprimentos,

    1. O objectivo desta ILC é a revogação da Resolução da Assembleia da República 35/2008, que dá cobertura à aplicação do AO90 no nosso país. As subscrições, que não têm prazo de validade, só se tornariam inúteis caso o objecto da ILC, por alguma razão, tivesse deixado de existir. É realmente como diz: quem já subscreveu a ILC em papel não precisa, nem deve, subscrevê-la novamente por via electrónica. A subscrição online ainda não está disponível mas, quando estiver, não deixaremos de sublinhar devidamente esse aspecto.
      Muito obrigado pelo seu apoio.

    • Maria José Abranches on 26 Julho, 2016 at 23:18
    • Responder

    Fico feliz com este novo fôlego da ‘nossa’ ILCAO. Tanto esforço, tanto empenho, tantas assinaturas confiadamente recolhidas não terão sido em vão! Vamos pois continuar com uma esperança renovada, agora que, na Assembleia da República, houve quem se batesse para corrigir os maiores excessos da Lei 17/2003, impeditivos da legítima participação dos cidadãos na vida nacional.

    Uma pergunta: enquanto a subscrição da ILC por via electrónica não estiver disponível, que impresso – em papel – poderemos usar? O mesmo ou outro?

    Cumprimentos e obrigada!

    1. Cara Maria José, muito obrigado pelas suas palavras. “Esperança renovada” é também aquilo que sinto e acho que, desta vez, esta nossa esperança é mais do que justificada.
      O impresso original continua válido (está disponível na secção “documentos”) mas, naturalmente, está a ser reformulado.
      Desde logo, a morada que consta no cabeçalho (o apartado 53) já não existe. Mas alguns dos campos existentes terão de ser também devidamente alterados — a mudança mais relevante é, como sabe, a introdução da data de nascimento.
      Em suma, se utilizar o impresso antigo, peça à pessoa em questão que acrescente à mão a sua data de nascimento. O preenchimento do campo com o nº de eleitor deixa de ser obrigatório. E a subscrição deve ser enviada para a minha morada: R. Frei Tomé de Jesus, 19 – 1º Dto. 3000-195 COIMBRA
      Bom trabalho!

    2. Maria José, actualizo a resposta que lhe dei: na secção “documentos” encontra-se já um impresso de subscrição em papel que pode ser utilizado sem necessidade de emendas.

        • Maria José Abranches on 30 Julho, 2016 at 23:33
        • Responder

        Obrigada! Já encontrei o novo impresso e vou divulgar pelos meus contactos.

        1. Obrigado, Maria José.

  1. Desde já me assumo como plenamente contra o Acordo Ortográfico de 1990 e acérrimo apoiante do de 1945. Porém, acho que reverter o processo neste momento, e anular completamente o novo acordo, é fazer aos que já só tomaram contacto com a nova ortografia o que fizeram quando a implementaram abruptamente. Por isso, creio que a melhor opção seria fazer um Movimento Pela Dupla Grafia do Português, no sentido de tornar ambas as grafias oficialmente aceites, conforme explicito aqui.

    1. Aceitar oficialmente as duas ortografias implica aceitar o AO — por definição, a sua proposta é incompatível com o objectivo que nos propomos alcançar com este site. De resto, reverter o processo não é “fazer aos que já só tomaram contacto com a nova ortografia o que fizeram quando a implementaram abruptamente”. Para que isso fosse verdade as duas ortografias teriam de ser equivalentes. Acontece que o AO90, como sabe, é um buraco — estético, técnico, informático, histórico, etc. Aquilo que se “implantou abruptamente” foi uma passagem de cavalo para burro. Reverter o processo, abruptamente ou não, seria uma melhoria. Meu caro senhor, não se preocupe com as nossas crianças. Como já disse algures, os alunos apanhados neste enredo ficarão infinitamente mais bem servidos com o AO45 — terão apenas a “maçada” de ficar a saber mais de ortografia de que as gerações que os precederam.

      1. Tenho a plena noção de que o Acordo Ortográfico de 1945 é infinitamente superior ao de 1990; por mim, acabaria num instante com o último e regressaríamos todos ao primeiro. Porém, também não podemos ser acometidos de um fervor tal que nos transformemos precisamente no inimigo que pretendemos combater: nuns ditadores linguísticos que impõem a sua visão independentemente das perspectivas de todos os outros…

        Em todo o caso, esta questão da dupla grafia seria apenas uma forma de se conseguir encontrar força suficiente para fazer uma mudança, visto que (teoricamente) seria medianamente consensual quer para acordistas, quer para anti-acordistas, gerando um maior número de apoiantes; visto que, conforme este artigo no-lo diz, a ILC está já próxima de recolher as assinaturas necessárias, esta minha preocupação, e, por extensão, esta minha sugestão fará já pouco sentido.

        Por isso, resta-me, apenas, dizer: votos de sucesso na vossa iniciativa, e abaixo o novo acordo ortográfico!

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