«O acordo do aborto da Língua Portuguesa» [“Correio dos Açores”, 13.03.15]

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O acordo do aborto da Língua Portuguesa

Dilma e Passos reafirmam Acordo Ortográfico para 2015, segundo referia a Agência Lusa a 10 de Junho 2013. E cito: “Portugal e Brasil acolheram com “satisfação” os contactos no quadro da CPLP para a elaboração dos Vocabulários Ortográficos Nacionais e reafirmaram que o acordo ortográfico entra em vigor em 2015, nos dois países. “Tendo em conta que o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (AOLP) entrará em vigor definitivamente em vigor em Portugal e no Brasil em Maio e em Dezembro de 2015, respectivamente, ambos os governantes reiteraram a importância da plena aplicação do AOLP em todos os países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), como forma de contribuir para o reforço da internacionalização da língua portuguesa”, refere a Declaração Conjunta da XI Portugal-Brasil que decorreu hoje em Lisboa, entre o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e a chefe de Estado brasileira, Dilma Rousseff.

A 15 de Dezembro de 2014, o Portal Brasil escreve “no Brasil, o acordo foi ratificado em Setembro de 2008 e as novas regras já estão em uso, embora em carácter não obrigatório, desde 1º de Janeiro de 2009. A princípio, as medidas seriam aplicadas de modo obrigatório a partir de Janeiro de 2013, mas o governo brasileiro, após consultas a envolvidos no processo, preferiu dar mais tempo para a implantação” e assim sendo “as novas regras do acordo ortográfico começam a ser obrigatórias no País a partir de 1º de Janeiro de 2016”.

Certo é que hoje o Acordo Ortográfico (AO) continua a dividir especialistas, governantes e a sociedade civil nos países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), surgindo mesmo pedidos de revogação, suspensão ou revisão deste por sectores do bloco lusófono.

Mas melhor mesmo são as afirmações do então Secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, que à TVI 24, numa reportagem publicada no Expresso afirmou que “o Governo se prepara(va) para alterar o Acordo Ortográfico até 2015 e que cada português é livre para escrever como entender”. O secretário de Estado da Cultura admitiu em entrevista à TVI-24 alterar até 2015 algumas regras do novo Acordo Ortográfico, que já estava em vigor nos organismos do Estado desde Janeiro deste ano.

Manifestando o seu desacordo com algumas normas, Francisco José Viegas lembrou que “do ponto de vista teórico, a ortografia é uma coisa artificial. Portanto, podemos mudá-la. Até 2015 podemos corrigi-la, temos essa possibilidade e vamos usá-la. Nós temos que aperfeiçoar o que há para aperfeiçoar. Temos três anos para o fazer”.

Questionado sobre a polémica decisão de Vasco Graça Moura que ordenou aos serviços internos do Centro Cultural de Belém (CCB) que não apliquem o novo acordo, o responsável pela pasta da cultura começou por lembrar que o presidente do CCB “é uma das pessoas que mais reflectiu e se empenhou no combate contra o Acordo Ortográfico” para seguidamente lembrar aqueles que “não têm qualquer intimidade nem com a escrita, nem com a ortografia, terem vindo criticar e pedir sanções”.

“Para mim é um não-problema. Os materiais impressos e oficiais do CCB obedecem a uma norma geral que vigora desde 1 de Janeiro em todos os organismos sob tutela do Estado. O Vasco Graça Moura, um dos grandes autores da nossa língua, escreverá como lhe apetecer”, acrescentou o governante.

“Às vezes quando escrevo como escritor tenho dúvidas e vou fazer uso dessa possibilidade, como todos os portugueses podem fazer uso dessa possibilidade, isto é, a competência que têm para escolher a sua ortografia. Não há uma polícia da língua. Há um acordo que não implica sanções graves para nenhum de nós”, rematou Francisco José Viegas.

E com isto, ou por outras, saiu do Governo.

Ontem, pasme-se, foi noticiado que “a partir deste ano os alunos vão ser obrigados a escrever com o novo Acordo Ortográfico nos exames nacionais. Se não cumprirem as regras, os erros podem cortar 25% da nota”.

Afinal já há “polícia da Língua”? Acabou-se a liberdade de cada português, face a um Acordo que nem em vigor está?

E como ficam todas as crianças e jovens que aprenderam, desde tenra idade, o AEIOU com base neste “fictício” acordo que ainda não viu a luz do dia?

A Língua Portuguesa tem de ser acarinhada, estimada, engrandecida! A Língua Portuguesa foi levada por nós, portugueses, e não outros, até onde as nossas naus conseguiram chegar, um pouco por todo o Mundo. Fomos nós os embaixadores do Português, enquanto que em troca nos davam canela e outras especiarias várias.

Vender parte da nossa essência por tuta e meia, por caprichos de acordos que – tal como muitos outros – nem servem para inglês ver…

Apenas digo que este é mais um exemplo de que Portugal se perdeu, os portugueses perderam a vontade de lutar, perderam o seu espírito de resistência.

Façam-se greves, façam-se boicotes, façam-se ouvir, senhores, senhoras, meninos e meninas portuguesas.

E se o acordo for mais um aborto? Se nunca chegar a nascer?

[Transcrição integral de artigo, da autoria de Ana Coelho, publicado no jornal “Correio dos Açores” em 13.03.15. “Links” adicionados por nós.]

 

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3 comentários

    • María Oliveira on 14 Março, 2015 at 23:54
    • Responder

    Pois “abortemos” o chamado AO90! Eu, que nunca lhe dei uso, abomino-o, recuso-o e é-me impossível reconhecê-lo como legítimo, seja onde, quando ou como for. Sou professora de Português e, nos livros de ponto (voltei a uma escola antiquada, pois já escrevia sumários em plataforma havia anos) nunca usei, não uso nem usarei o “aborto gráfico”. Está lá, sem medos, a minha Língua-Mãe, à espera das “sanções disciplinares”. TODOS os meus alunos compreenderam, pois expliquei-lhes claramente (passe a redundância) como este AO90 era um negócio com cheiro a podre. A miudagem escreve, agora, como as abéculas dos meus colegas que me e nos envergonham lhes exigiram, mas a maioria ignora a “novilíngua” (sabendo que não os penalizo, é claro, pelo uso das “novifórmulas” que os obrigaram a deglutir acefalamente). A juventude, sem teias de aranha no orgulho nacional, corajosa e apreciando os que lhes são sinceros, aplaude sempre que lhes digo: recuso-me a escrever erros, recuso-me a ensinar “aquilo”, recuso liminarmente a subjugação e, no fim, digo-lhes (como digo aos colegas que confronto e ficam sempre envergonhados ao dizer, como as SS, que só cumpiram ordens): há uns anos, um jornal canadiano (?) escrevia: “Portugal ajoelha(-se) ao CRIOULO do Brasil”. Esta frase muda tudo, não é?…

    • Maria José Abranches on 15 Março, 2015 at 12:16
    • Responder

    Como sempre, muito bem, cara colega Maria Oliveira! Assim houvesse um mínimo de espírito crítico e de verticalidade nos professores – TODOS, mas particularmente nos de Português: nunca esta ignomínia se teria instalado na nossa “Língua-Mãe”! E é dando o exemplo desta subserviência e desta moleza que queremos ajudar a formar e a estruturar cidadãos?!

    «O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.»
    (Martin Luther King)

  1. Maria Oliveira e Maria José Abranches, obrigado (mais uma vez) pela vossa coragem. É bom saber que, um pouco por todo o Portugal, cresce a resistência a esta ocupação externa que é o Acordo Ortográfico, e quando digo externa penso que toda a gente entende… O jornal canadiano tinha inteira razão quando, há uns anos, escreveu “Portugal ajoelha-se ao CRIOULO do Brasil”. E o pior é que, por culpa dos ‘cumpridores de ordens’, permanece ajoelhado… e de calças em baixo. Enfim, esperemos que a nossa resistência seja premiada e que em breve todos possamos comemorar o Dia da Libertação!

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