Boato, ameaça ou manobra de diversão?

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«Provavelmente esta nova ideia luminosa agora apresentada por Pimentel y sus muchachos não foi apresentada para ser aprovada. A ideia por trás desta proposta deve ser a de apresentar uma alternativa tão disparatada e desprovida de toda a lógica que convença os até agora resistentes ao acordo a conformarem-se com ele e a aceitá-lo de uma vez pois a alternativa é tão estapafúrdia que se vêem obrigados a escolher o menor dos males.»
Olga Rodrigues (comentário no Facebook)


Afinal, este “AO2016” foi um simples “boato”, é uma ameaça real ou não passa de (mais uma) manobra de diversão?

Boato” é o que diz dele, por outras palavras, o senador Cyro Miranda, desmentindo assim o Senado de que faz parte e desmentindo-se até a si mesmo e aos seus pares.

Então, se era apenas um “boato”, já não é uma ameaça, certo?

Errado. É uma ameaça que faz parte de uma… manobra de diversão.

A táctica parece-me nisto evidente e é de resto utilizada amiúde no chamado “jogo político”: ameaçar com um “facto” horripilante iminente para tentar garantir a subsistência de um outro que, apesar de não menos horroroso, parecerá ainda assim bem menos assustador. Genericamente falando, trata-se de agitar um espantalho monstruoso, qual bicho-papão, para que as pessoas, como se fossem criancinhas, passem a ver com olhos mais condescendentes o monstro real que na verdade se pretende fazer passar.

No limite, permitirá esta táctica levar alguns a não apenas ver com condescendência o monstruoso AO90 como até a acolher-se à sua “proteção”. “Do mal, o menos”, não é o que se diz nestes casos?

É, é mesmo isso o que se diz. Mas diz-se mal.

Tendo sucesso este estratagema político, no que ao “acordo ortográfico” diz respeito, não apenas alguns dos resistentes cairão inocentemente no logro como, ainda por cima, os acordistas militantes irão aproveitar a “deixa” para, agarrados com ainda mais afinco ao seu “querido” AO90, passarem a apresentá-lo como a salvação para que este outro desastre não ocorra!

Estão já por todo o lado, à vista de quem quiser ver, as provas de que a “ameaça” não passa, afinal, de uma manobra de diversão. Estamos neste preciso momento debaixo de “fogo de cobertura”.

Temos, ainda “frescos”, os ecos da “reação” de Evanildo Bechara (pois quem mais poderia ser o primeiro a “chegar-se à frente”?) a esta coisa pimenteliana:
«É claro que a ideia não passa despercebida e já há quem se oponha veementemente – uma das vozes mais sonantes é a do “guru” Evanildo Bechara, autor da Moderna Gramática Portuguesa e membro da Academia Brasileira de Letras (e, já agora, da Academia das Ciências de Lisboa e Honoris Causa pela Universidade de Coimbra).»

Ou esta outra “reação”, desta vez de um jornal brasileiro com o enigmático título “Mundo Lusíada”:
A actual discussão no Senado brasileiro sobre a simplificação da ortografia revela-se contraprodutiva em relação ao acordo ortográfico.

E só mais uma “reação”, só mais uma amostra — para não cansar as pessoas de bem:
É muito improvável que a população brasileira se entusiasme com uma proposta radical como essa. Basta lembrar a saraivada de críticas de que foi alvo o Acordo Ortográfico de 1990 (vigente desde 2009), responsável por pequenas alterações (acentos e hifens) em 0,5% do léxico.

As baterias deste “fogo de cobertura” são imensas e nem todas disparam do lado de lá do Atlântico. Por pudor (ou por vergonha) não cito aqui um único dos que, do lado de cá, vão lançando também suas granadas de mentira.

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3 comentários

    • Maria José Abranches on 24 Agosto, 2014 at 1:22
    • Responder

    O Brasil pode fazer o que quiser com a ortografia da sua língua, que este Acordo pouco modifica, aliás, pois foi concebido para destruir o Português europeu!

    Nós, portugueses, não queremos o AO90, que não só não “unifica” coisa nenhuma – o que é totalmente impossível e é evidente para qualquer indivíduo que tenha dois dedos de testa – como é um atentado à língua de Portugal.

    O interesse do Brasil em chamar a si o domínio da “internacionalização” do Português salta aos olhos dos cegos, basta ver a extensão planetária da nossa língua. A estupidez dos políticos portugueses e outros, defensores do AO90, decorre da habitual dupla faceta nacional: somos pequeninos, enfezadinhos, insignificantes, mas, “colados” ao Brasil, seremos de novo “grandes”, pois um novo um “império”, com as suas promissoras riquezas e um IMENSO prestígio, se abre na nossa frente!

    Não queremos o AO90 nem outro qualquer! Acabou!
    Formem correctamente professores de Português, tradutores, jornalistas; invistam na investigação e no conhecimento da língua; produzam dicionários, gramáticas, métodos para ensino da língua aos estrangeiros; ensinem capazmente a língua materna em Portugal e apoiem as vastíssimas comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo; falem e escrevam correctamente o Português europeu nas instituições e situações internacionais; colaborem com todos os países que adoptaram o Português como língua oficial – Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor – e todas as regiões do globo aonde ainda permanece a língua que para lá levámos (Macau, Goa, por exemplo)!

    Política de língua é isso! Não é andarmos a estropiar a ortografia e a deitar pela borda fora anos de trabalho e de gastos com a alfabetização e a escolarização dos portugueses, com o equipamento das bibliotecas públicas e privadas, com uma imagem e uma afirmação consolidada da nossa língua na Europa e no mundo!

    Devemos ser o único povo à superfície do planeta que não só se envergonha da sua língua, como a despreza e desrespeita, para parecer “moderno e desempoeirado”!

    Repito: vamos continuar a permitir que os políticos se comportem como se tudo estivesse já decidido, perpetuando um tabu que tanto jeito lhes dá? Haverá ainda jornalistas dignos dessa profissão que não tenham medo de lhes fazer as perguntas urgentes e necessárias? E os que estão filiados nos vários partidos e/ou ocupam cargos ou lugares de relevo, cuja voz tem peso no país, de que estão à espera para “gritar” a condenação deste AO90? Foi há 40 anos o 25 de Abril e já estamos de novo “caladinhos e submissos”?!

    • Elmiro Ferreira on 25 Agosto, 2014 at 3:44
    • Responder

    Bem-haja Maria José Abranches, pela clarividência! Só quem está burro ou de má-fé pode defender uma fraude como é o “AO90”.

    • Jorge Pacheco de Oliveira on 25 Agosto, 2014 at 9:35
    • Responder

    Excelente comentário de Maria José Abranches. Apenas discordo desta passagem :

    «Devemos ser o único povo à superfície do planeta que não só se envergonha da sua língua, como a despreza e desrespeita, para parecer “moderno e desempoeirado”!»

    Creio que seria mais correcto assim :

    Devemos ser o único povo à superfície do planeta cujos dirigentes não só se envergonham da sua língua, como a desprezam e desrespeitam, para parecer modernos e desempoeirados.

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