«Superficialidade, mãe das banalidades» [Alda M. Maia, “blog”, 24.02.14]

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Não somente genetriz de banalidades triviais, mas também de erros, frequentemente derivados de exibicionismos dispensáveis.

Estive a ouvir os comentários do prestigiado escritor e jornalista da RTP, José Rodrigues dos Santos, no debate que se realizou na Biblioteca da Câmara Municipal de Cascais, no dia 21 deste mês, sobre o Dia Mundial da Língua Materna / Acordo Ortográfico – www.cedilha.net/ilcao

Transcrevo as suas opiniões, as quais me deixaram atónita por aquilo que demonstraram! Vejamos:

“Nós temos que unificar a língua no ponto de vista da grafia, para não ficarmos numa situação em que, daqui a 200 ou 300 anos, do português nasçam línguas diferentes, como da língua hispânica nasceram várias línguas. Os galegos, há 300 anos, falavam português. Hoje já só falam galego que é uma língua diferente do português. Portanto, nós não podemos deixar que isso aconteça ao português do Brasil, do português de vários países africanos e do português de Portugal. Portanto, é importante unificarmos a grafia para preservarmos a língua”.
Nós temos de ter uma grafia unificada para não termos várias línguas diferentes”.

José Rodrigues dos Santos é um excelente jornalista e um escritor de sucesso, doutorado em Ciências da Comunicação, logo, podia ter-nos poupado esta enfiada de banalidades e, digamo-lo, aneiras.

Primeiro: o povo galego – século VIII – XV – não falava português, mas uma língua literária comum de grande prestígio, isto é, o galaico-português.
“O galaico-português adquiriu um tal requinte sob a sua forma escrita, que se tornou, no conjunto global da Península Ibérica, uma língua poética de predilecção. O próprio rei de Castela Afonso X, o Sábio (1252-1284), que tanto se ilustrou com os seus poemas, se tornou enquanto poeta num dos arautos mais apreciados do galaico-português” – do livro: “A Aventura das Línguas do Ocidente”, de Henriette Walter, pág. 202

Segundo: “os galegos, há 300 anos, falavam português”, diz José Rodrigues dos Santos.
Falavam português no século XVIII?! Ninguém ensinou ao ilustre jornalista e escritor que, após o nascimento do reino autónomo de Portugal (séc.XII), Portugal e Galiza ficaram politicamente separados e a língua comum seguiu estradas diferentes, enquanto do outro lado da Península se ia impondo o castelhano?
As populações da Galiza continuaram a falar galego, certamente, embora esta língua, a partir do séc. XV, tivesse ficado na sombra por imposição do castelhano e, só recentemente, é que foi reconhecido como uma das línguas oficiais da Espanha.
Sempre na obra de Henriette Walter, podemos ler: “Em 1492 foi o ano da publicação da primeira gramática do castelhano, escrita por António de Nebrija, um andaluz. Nesta gramática observa-se a consagração do castelhano como a grande língua do Estado espanhol”

Galego e português: dois falares diferentes, mas a generalidade dos linguistas é de opinião que “ainda hoje constituem a mesma língua”, o que me agrada.

“Da língua hispânica nasceram várias línguas”, assevera ainda José Rodrigues dos Santos.
Quais são as línguas que nasceram do espanhol, também conhecido como castelhano ou hispânico?

Na Espanha existem a língua oficial espanhola e as línguas regionais oficiais: o basco, o catalão e o galego. Exceptuando a língua basca, cujas origens ainda não foram bem determinadas e, portanto, jamais poderia derivar do castelhano, o catalão e o galego, paralelamente ao castelhano, são línguas românicas, línguas que nasceram autónomas.

O hispânico difundiu-se, à semelhança do que aconteceu com a língua portuguesa, por vários continentes. Difundiu-se, não deu origem a outras línguas nos países da América Latina, Filipinas, etc., hoje conhecidos como “países hispanófonos”. Falamos de línguas, não de dialectos.

Se o Sr. Dr. José Rodrigues dos Santos quer participar em debates e dar a sua opinião sobre o que deve ser a ortografia da língua portuguesa, aconselhá-lo-ia a estudar melhor a sua língua materna, pois demonstra péssimos conhecimentos sobre esta matéria, o que é imperdoável, dada a sua formação académica.
Simultaneamente, evitaria também de proferir tantas banalidades penosas e sem sentido.

A comparação que faz do engenheiro português com o engenheiro grego (que eu não transcrevi) é, simplesmente, penosa.

“Temos que unificar a língua no ponto de vista da grafia”; “Portanto, é importante unificarmos a língua para preservarmos a língua. Nós temos de ter uma grafia unificada para não termos várias línguas diferentes”.

Expressar esta opinião de uma forma tão superficial e pobre de argumentos linguísticos sérios e incontroversos, também isto é de uma banalidade confrangedora.

E por aqui vemos quem são os defensores do Acordo ortográfico!

“As modificações linguísticas fazem-se sentir em todo o organismo de cada língua: na fonética alteram-se os sons; na morfologia eliminam-se umas formas, introduzem-se outras, modificam-se quase todas, etc.; na sintaxe substituem-se uns modos de construção por outros, e até as próprias regras fundamentais são alteradas. No vocabulário, porém, é que estas mudanças mais se fazem sentir, por serem mais numerosas, mais rápidas e mais fáceis de observar” – “Gramática Histórica da Língua Portuguesa” (VI e VII Classes do Curso dos Lyceus) – 1900 ou 1901, pág. 13 – de António Garcia Ribeiro de Vasconcelloz.

[Transcrição integral de “post“, da autoria de Alda M. Maia, publicado no “blog” Pensamentos Vagabundos em 24.02.14. “Links” inseridos por nós.]

[Imagem “recortada” de vídeo de ISS – International Space Station, editado e publicado por SpaceRip.]

Nota: neste como em qualquer outro conteúdo, as ligações a entradas “wiki”, não havendo alternativa em Português, são sempre feitas preferencialmente às versões em Inglês, Francês ou Castelhano. Evidentemente, recusamos a “Wikipédia Lusófona” pelas suas total “acordização” e selvática brasileirização.

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3 comentários

  1. Mas alguém esperava uma opinião abalizada e com argumentos sustentáveis de José Rodrigues dos Santos? Lê-lo é penoso, tão mal escreve, com ou sem Acordo Ortográfico.
    Não serei eu a contribuir para lhe engordar a pulposa (como as giraças que põe nos livros a martelo) conta bancária. Dele li um único livro, emprestado. No outro, que me foi oferecido, não consegui passar da página cento e muito poucos.

  2. “Na Espanha existem a língua oficial espanhola e as línguas regionais oficiais: o basco, o catalão e o galego.”
    I el valencià, per descomptat.

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