Depoimento do deputado Michael Seufert em audiência CECC/CNECP, 27.11.13

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[transcrição]
Muito obrigado, Senhor Presidente. Senhor Coordenador e Senhores Professores, agradeço-lhes a exposição que aqui nos vieram trazer e, enfim, terem-se deslocado aqui a Portugal para darem nota dos trabalhos de que o Senado Federal os imbuiu.

Eu li a carta que o Presidente da Comissão, o Senador Cyro Miranda, nos enviou, e aliás tenho-me correspondido com ele entretanto, porque notei a criação deste grupo de trabalho e deixou aqui alguma… creio que a criação deste grupo de trabalho tem algum valor. Porque, de facto, eu não vou, não me vou pronunciar sobre as questões concretas que aqui aduziu sobre os problemas que ainda identifica na Língua Portuguesa e que quer tentar resolver com o vosso grupo de trabalho. Até porque algumas delas não se põem para quem fala Português de Portugal. A questão do trema para mim não existe porque nós aqui não a conhecíamos, não é? Eu pelo menos, nasci em ‘83, e não a, nunca a escrevi, portanto para mim é um não-problema. Mas compreendo, evidentemente, para quem está habituado a usar esse auxiliar gráfico, que ele é, ele pode significar um problema. Mas acho que politicamente, de facto, não tecnicamente, e se calhar esta conversa teria eu de ter com os vossos, com quem vos imbuiu, vos pediu isto, com os Senadores, não é?

Enfim, por interposta pessoa, politicamente, aquilo que os senhores aqui vêm dizer, ou o que o Senado Federal veio dizer, é que o acordo morreu de alguma maneira, eu apercebi-me também disso, assim o professor disse que isto não significa que se queira andar, que se queira matar o acordo, mas na verdade, quando o Senado Federal diz que cria um grupo de trabalho com o objectivo de simplificar e aperfeiçoar o complexo acordo, estou a citar a carta do Senador Cyro de Miranda, e que ao final do ano a intenção é propor um documento com sugestões ao texto já conhecido, quer dizer, e eu acho, eu compreendo isso, e até acho isso positivo, que o Senado do Brasil decidiu que o acordo não serve para aplicar no Brasil e que quer fazer outra coisa do acordo. E eu, eu devo-vos dizer, eu compreendo isso e acho que isso é positivo.

Tenho pena que o Parlamento português e o Estado português não tenham seguido também uma abordagem desse tipo, porque, de facto, as questões do acordo têm sido levantadas em vários fóruns e também aqui no Parlamento com manifesta impreparação, as questões que aqui referiram dos vários, às vezes conflituantes, vocabulários que foram publicados, dicionários publicados, fenómenos que nós aqui ouvimos no grupo de trabalho, em escolas, em que os alunos praticam já uma hipercorrecção, retirando letras que se lêem, em “facto”, por exemplo, é um exemplo clássico. E vê-se às vezes, infelizmente, até em textos assinados por jornalistas, ou na televisão, em que há fenómenos de hipercorrecção, em que se eliminam letras que o acordo, nem nas suas bases, nem nos seus vocabulários elimina.

Enfim, mas isto cada um faz a avaliação que quiser sobre isto, acho que isso é um debate que pode ser tido noutra altura, o facto objectivo que os senhores nos trazem aqui é uma, com a carta que recomenda a vossa visita aqui, é que o Brasil decidiu andar para a frente nesta questão, e eu compreendo isso, acho que isso deve convocar o Estado português a dizer também, bom, dizer alguma coisa sobre isso, e eu acho que deve ser, de facto, que não devemos pelo menos fazer o que aconteceu em ‘45, que é haver um acordo com o objectivo de unificar e depois acaba por Portugal dar esse passo e fica sozinho com uma ortografia que o Brasil também não quis e, bom, ‘45 já lá vai, não é, na verdade, como é evidente. Mas hoje, em 2013, eu julgo que seria também mau para Portugal se tivesse sido dado um passo em conjunto entre os países de língua portuguesa em que, que não conseguiram ratificação e que portanto o acordo original não está ratificado, na verdade; o que está ratificado é um protocolo em que os próprios países que entenderam poderem avançar com o acordo mesmo que os outros não quisessem. E mesmo esses, que assinaram esse protocolo, vê-se agora no Brasil, e tendem também a não dar continuidade, ou pelo menos, cito novamente, “aperfeiçoar e simplificar o complexo acordo”, como nos escreveu o Presidente da vossa Comissão de Educação, Cultura e Esporte.

E por isso, acho que isto deve aqui, tem, politicamente, terá que levar aqui a um debate entre, dentro de Portugal, estou a fazer a minha interpretação, só, sobre isto e também vos digo que o meu partido é o único partido aqui no Parlamento cuja opinião foi sempre deixada à discrição de cada um dos deputados e, portanto, quando se votou esse tal Protocolo Modificativo, que dizia, então, não foi ratificado o acordo original, mas agora avançam para o acordo os países sem, mesmo, que não se obtenha o acordo da totalidade da lusofonia, foi o único partido em que houve votos contra, a favor e abstenções nessa mesma votação.

Porque, de facto, o partido CDS tem dado liberdade aos seus deputados para transmitirem essa, para fazerem valer a sua opinião pessoal nesta questão, não havendo aquilo que nós aqui chamamos de “disciplina de voto”, que há em matérias variadas, mas nesta isso não aconteceu.

Sendo assim, eu agradeço a vossa visita, aquilo que nos trouxeram aqui, de facto, não quero comentar, eu creio que a questão está antes disso, está na própria, no acto de constituição do vosso grupo de trabalho técnico, que eu, cuja constituição eu não só compreendo como, se fosse deputado do Senado brasileiro, aprovaria também, aprovaria igual constituição aqui também, ou, mas acho que é o momento de Portugal olhar de facto para o acordo e, em conjunto ou não com o Brasil, pelo menos reconhecer que, se o acordo morreu, não deverá ser Portugal o único país a avançar para o acordo que não é acordo.

Foi assinado, mas não conseguiu levar a sua avante e acho que não há problema em assinar, em recompreender isso, quando um acordo se torna noutra coisa qualquer.

Muito obrigado.
[/transcrição]

[Transcrição do depoimento do deputado Michael Seufert prestado em “reunião de trabalho”, subsequente a audiência conjunta (CECC/CNECP) concedida a dois delegados do Senado brasileiro, na Assembleia da República portuguesa, a 27 de Novembro de 2013. Destaques e “links” de nossa responsabilidade.]

[Gravação integral desta “reunião de trabalho” disponibilizada pela A.R. AQUI.]

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5 comentários

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    • Isabel Belo on 9 Dezembro, 2013 at 14:36
    • Responder

    Em resumo, vou continuar a escrever como me ensinaram, tendo também em atenção as alterações de 1973

  1. Muita cerimónia. Nada auspicioso, sinceramente. Com tanta inépcia acabamos como em 45.
    Cumpts.

    • Luís Ferreira on 10 Dezembro, 2013 at 23:02
    • Responder

    A intervenção de Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas é absolutamente lamentável.

    • Luís Ferreira on 10 Dezembro, 2013 at 23:22
    • Responder

    E a intervenção de Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda também não muito melhor, apesar de não dar como encerrada a questão, o que só por si é bom.

    • Maria José Abranches on 12 Dezembro, 2013 at 20:04
    • Responder

    Vale a pena ouvir a gravação, para que se perceba o que está realmente em causa, no Brasil e por cá.

    Saliento a intervenção da deputada Gabriela Canavilhas, já que o PS foi o grande acelerador desta desgraça:
    “… o processo político está em curso e está fechado”… cabe ao IILP dar andamento ao processo … “para nós o trabalho político está concluído!”

    Referindo-se aos Professores brasileiros presentes, diz que levantaram “questões que extravasam o Acordo: o trema, o hífen…”
    Mas esta senhora alguma vez pôs os olhos em cima do texto do AO90? É favor verificar:
    “Base XIV – Do trema”; “Base XV – Do hífen em compostos…”; “Base XVI – Do hífen nas formações…”; “Base XVII – Do hífen na ênclise, …”

    Impõe-se constatar o que esta atitude significa “Nós, políticos, não percebemos nada de língua, nem de ortografia, nem do AO90, mas temos o poder!”

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