«O que queres que eu faça?» [Rodrigo de Sá (em comentário)]

reguaVistaPrint«#7 | Escrito por Rodrigo de Sá

Não ouvi nem li Miguel Sousa Tavares dizer que os professores eram os inúteis mais bem pagos de Portugal. Não comentei quando me referiram tal facto, pela simples razão de que a ser verdade, poderá ter surgido num contexto específico que lhe conferisse alguma veracidade. A verdade é que entrar na sala de professores e ouvir “Contacto ainda leva o C?” e ouvir como resposta “Como é que dizes? Contakto? Então não leva o C”. Ou ainda, “Eu não gosto nada disto. Fica mesmo feio. Óptimo sem o p, ou os meses do ano”, mas ainda assim não consigo arranjar quem me assine as cópias do formulário da ILC, associadas estas a outras tantas situações entre professores que comem o AO como se nada fosse com eles, fico com a certeza de que Miguel Sousa Tavares ao eventualmente ter dito que os professores são os inúteis mais bem pagos do país, terá tido a sua razão. E refiro novamente a vez quem em vergonha expliquei a uma professora de Língua Portuguesa que os dias da semana não perdem o hífen.

Vive-se nas escolas em função dos sindicalismo, o carreirismo e a obediência, mesmo que isto implique a submissão, a vergonha ou a vandalização dos princípios morais e intelectuais de cada docente.

Há documentos oficiais desde o início do ano lectivo 2011/2012 redigidos, assinados e entregues por mim que obviamente não foram escritos ao abrigo de tais regras, nem tive a mínima paciência para contornar o acordo ortográfico, e mantendo o sentido usar uma grafia que não chocasse com o dito. Até hoje vieram-me pedir explicações?

Dizem-me, “ó Rodrigo tens razão no que dizes. Mas o que queres que eu faça? Eles é que querem assim.”

Eu fico sem saber quem são eles, porque não tenho coragem para ouvir a resposta. A inércia tem-se revelado a maior fraqueza dos professores em Portugal. Somos os inúteis mais bem pagos do país? Não sendo para isto que aqui estamos, foi nisto que nos tornámos: de todos os inúteis deste país, somos os mais bem pagos. O que não quer dizer em termos absolutos que 1100 euros mensais ao fim de 10 anos de docência é ser bem pago, tendo em conta todo o resto inerente à actividade docente, é ser bem pago. Mas perdemos o respeito por nós próprios em nome de uma carreira, mesmo que ela não seja eficaz ou honrada.»

Rodrigo de Sá

[Transcrição de comentário, da autoria de Rodrigo de Sá, neste mesmo “site”, 21.01.13 às 15:22 h.]

Print Friendly, PDF & Email
Share

Link permanente para este artigo: https://ilcao.com/2013/01/21/o-que-queres-que-eu-faca-rodrigo-de-sa-em-comentario/

9 comentários

Passar directamente para o formulário dos comentários,

  1. Eu tenho casos mais ingratos. Gente que me assinou os impressos da I.L.C. porque o «Acordo» era péssimo, logo à primeira voz do patrão desatou a escrever asneiras. É uma pena vir rodeado de gente assim. Com gente assim, como não hão-de vir por cá tróicas e outros ladrões gadanhar-nos as coisas?
    Uma lástima!

    • Jorge Teixeira on 21 Janeiro, 2013 at 19:29
    • Responder

    Este post transmite muito bem uma parte da minha frustração com os professores deste país. No caso do AO90 é especialmente triste, quer o que o autor relata, quer coisas piores ainda, que é o fervor de cristãos-novos que anima muitos professores que até inventam quedas de “c” e “p” em palavras que nunca os perderam!

  2. Com tristeza confirmo o que Rodrigo de Sá e ‘Bic Laranja’ escreveram. Também eu conheço pessoas que se manifestaram contra o AO, assinaram petições e agora… bem, agora dão uma no cravo e outra na ferradura… Conheço, inclusive, uma professora de Português que era frontalmente contra e actualmente, como diz Rodrigo de Sá, come o acordo todo, arrotando o mesmo tipo de observações que o autor testemunha no seu estabelecimento de ensino. Felizmente, por cada dois ou três que ‘baixam as calças’ há dez que levantam a voz contra este desconchavo! A questão prende-se com a falta de coragem, ou melhor, com a falta de coluna vertebral de que padecem muitos portugueses – “Vive-se nas escolas em função do sindicalismo, o carreirismo e a obediência, mesmo que isto implique a submissão, a vergonha ou a vandalização dos princípios morais e intelectuais de cada docente.”
    Razão tinha Guerra Junqueiro quando, há mais de cem anos, escreveu o seguinte texto:
    “Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai”. Esperemos que o futuro demonstre que já não é assim…

  3. Depois do envio do meu comentário li o de Jorge Teixeira. Também já assisti a esse tipo de ‘correcções’ por parte de gente… mais papista do que o Papa. O que confirma a necessidade – e urgência – de travar o monstro.

    • Maria Oliveira on 22 Janeiro, 2013 at 10:08
    • Responder

    Bom dia!

    Atenção, Rodrigo de Sá (e acredite que serei a última no país a dizer a quem quer que seja, sobre o que quer que seja “cuidadinho, tenha medo, muito medinho…”):
    ficou provado há uns dois ou três anos que M.S.T. nunca afirmou que os “professores são os…” x, y, z… Alguém deturpou o que aquele senhor tinha dito, pois é conhecido o seu odiozinho de estimação a(os) professores em geral (basta ouvir as atoardas na tv, pois só lhe falta dizer que fomos nós que provocámos as duas Guerras Mundiais (mas toda a gente sabe que a culpa “foi da Yoko * (Ono)”!)
    Conheço quem tenha tido de pedir a M.S. Tavares desculpas formalmente por dizer que o mesmo afirmou isso, ou… tribunal com essa professora! Queira investigar, por favor, se lhe interessa saber mais.

    Como professora também lhe digo que subscrevo o que diz: o “acordo” (A.O.90) é uma aberração e eu NUNCA escreverei aqueles erros!

    * Sobre a tudo menos privada “piada da Yoko” (sim, a ex de John Lenon), parece que sempre que algo corria menos bem com os 4 de Liverpool, já se sabe a quem atribuíam as culpas!… Nós, os “stôres”, somos a Yoko de M.S.T. 😀

    (Ele só venerava a sua professora do chamado “ensino primário”, segundo já fez saber em crónicas… Será melhor que nada…)

    😀

  4. Caríssima Mariana Oliveira, por acaso o mesmo nome da melhor aluna do quadro de honra da minha escola do ano lectivo 2011/2012, repito, não ouvi dizer nem li o Miguel Sousa Tavares referindo-se aos professores em tais termos. E continuo no meu comentário, convertido em artigo, a dizer que não comentei porque queria antes de mais confirmar se tinha sido ou não tal acusação feita por este homem. Quanto a isto, obrigado pelas informações extra sobre o desenvolvimento do caso, mas para mim o assunto deixou de me interessar pouco tempo depois, uma vez que ninguém confirmou ao certo se tal aconteceu, não passando de um “ouvi dizer”.
    A Mariana ofende-me com a comparação a Yoko. Apesar das afinidades musicais com os fabulosos, eu uma Yoko? Ó Mariana, tenha juízo. Eu sou mesmo uma Edith Piaff, “je ne regrette rien”.
    Acrescento ainda que já me disseram “Contacto não leva o c”, ao que perguntei “Mas se não leva, porque é que o dizes?” e respondem-me “Não sei, mas sei que contacto deixa de ter o C”.

    1. Caro Rodrigo de Sá, há aí um equívoco da sua parte, acredite (e equívoco não apenas no nome da pessoa). Maria Oliveira é uma veterana desta luta.

    • Hugo X. Paiva on 22 Janeiro, 2013 at 18:35
    • Responder

    Há um mal entendido sim senhor!

  5. Não, eu estou em paz e em paz venho. Quis ser irónico usando também personagens do mundo da música. Causei desconforto? Peço desculpa, não era de facto a minha intenção. E peço também desculpa pela troca do nome. Eu juro que li Mariana.

Responder a Jorge Teixeira Cancelar resposta

O seu endereço de email não será publicado.