«’O’ CPLP» [Vasco Graça Moura, “DN”, 16.01.12]

Vasco Graça MouraPelos vistos há quem, tendo defendido apressadamente a entrada em vigor do Acordo Ortográfico e a sua pronta aplicação entre nós, comece a entrar em pânico, por ver agora esse viçoso horizonte da escrita lusitana recuar para o limbo da irrecuperabilidade de tão fecundas perspectivas.

Realmente, o esforço que essas pessoas despenderam está a tornar-se dia a dia mais inglório para tão destemidos seres. Mas eles ainda tentam uma cartada desesperada: alvoroçam-se a advertir as massas ignaras de que, nada disso!, o Brasil mais não fez do que adiar a data de início de aplicação do famigerado documento e, como acontece com o Benfica, quem não é por ele não é bom chefe de família!

Consideram intolerável que andem por aí uns vadios de bazuca ao ombro que não desistem de atirar contra esse texto sacrossanto e afinal ele mantém-se em vigor, forte, fiel, façanhoso, no esplendor inconsútil e diamantino da sua formulação de 1990…

O azar dos Távoras desses defensores do Acordo é que, primeiro, nunca leram devidamente o texto dele e, segundo, não têm lido os jornais, em Portugal e, sobretudo, no Brasil.

Se o tivessem feito, teriam percebido sem grande convulsão cerebral por que razões até o Brasil recusa o dito na sua forma presente, de tão mau que o papel é, e ficavam também a saber que o adiamento veio culminar um processo de protestos consecutivos da sociedade civil brasileira reclamando toda uma série de alterações às normas nele contidas.

A sequência e o encadeamento destes factos indiscutíveis e amplamente noticiados num crescendo que marcou as últimas semanas de 2012 (basta ir ao Google para o verificar) mostram que o adiamento é um acto político que dá resposta a essas reclamações e abre a porta às alterações que forem julgadas necessárias.

Sendo assim, pode dizer-se que o AO não foi alterado pela decisão de adiamento da Presidente brasileira, mas também se pode ter a certeza de que ele será alterado pela revisão a que vai ser sujeito, seja ou não proposta aos outros países de língua portuguesa que nela participem!

E por isso mesmo, também pode dizer-se que não se sabe em que é que vão consistir as alterações, sobre que pontos vão incidir, em que aspectos e características da língua se pretenderão baseadas, em que negociações, se negociações houver, assentarão.

Ou seja, pode prever-se com excelentes razões e grande margem de segurança que essa coisa insensata que se está a tentar aplicar em Portugal, sem que ninguém, aliás, saiba bem como o fazer, vai deixar de ser o que é e não servirá para nada, a não ser para aumentar a confusão e lesar ainda mais a língua portuguesa.

Os defensores do AO agarram-se desesperadamente à situação que eles mesmos ajudaram a criar, procurando que fosse imposto e adoptado sem discussão, jogando nas evasivas, escamoteando o que se passa em Angola e Moçambique, esgueirando-se à revelia das normas jurídicas e científicas aplicáveis, colaborando no atropelamento das mais elementares regras de bom senso, dando como facto consumado a submissão da sociedade civil à força da asneira.

Nesse engano de alma ledo e cego, sentem-se porventura mais confortáveis com as três ortografias que estão a ser aplicadas, deixam vibrar amplamente os humores com a tal “unidade” da língua portuguesa que afinal contribuíram para desmantelar e agora acorrem, num transe de subtileza hermenêutica que de repente deles se apossou, a proclamar que tudo está como dantes e nada aconteceu…

É pena. Deveriam escabujar dando punhadas grossas no peito, fazer o mea culpa de preceito e deixar-se de fitas. E deveriam ajudar a pensar como se há-de encontrar uma solução decente para o imbróglio em que Portugal está metido por causa deles.

Deveriam também tapar a cara de vergonha e pedir sem demora a demissão de membros efectivos desse homólogo da CPLP que é “o” CPLP (Clube das Pantominas na Língua Portuguesa).

Vasco Graça Moura

DNlogo

[Transcrição integral de artigo de opinião, da autoria de Vasco Graça Moura, publicado no “Diário de Notícias de 16.01.2013. Links inseridos por nós.]

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6 comentários

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  1. Força VGM! Não desista de defender a língua portuguesa, nomeadamente a actual ortografia, porque ainda é a mais correcta e a melhor para nós. As razões dos que se opõem ao AO saltam à vista e já foram sobejamente explicadas por outros em diferentes orgãos de comunicação. O AO é altamente lesivo para a nossa identidade linguística, para a nossa cultura, para o nosso futuro enquanto nação europeia. Por tudo isso é um crime contra a Pátria. E os crimes devem ser julgados de acordo com a sua gravidade e consequências.

  2. Este senhor é completamente louco e fanático. Não muda o disco e só fala neste bendito acordo ortográfico…
    Ora, quem quiser continuar escrevendo na forma que fique à vontade; quem quiser se atualizar, que atualize e adote o AO.
    Discussão chata e cansativa!

  3. Para as inteligências curtas de alcance, este aborto ortográfico não é nem pretende ser algo deixado à consciência de cada um. Pretende ser normativo, e em Portugal assistimos a um abuso de poder sem precedentes com a tentativa da sua aplicação forçada nas escolas, nos organismos públicos, jornais, recorrendo a várias formas de coacção relativamente aqueles que resistem.
    Uma delas, a mais grosseira e pedestre, é a de tentar ridicularizar e menorizar as formas de intervenção cívica contra esta enormidade.
    Como não há argumentos válidos a favor do AO, o argumento utilizado para o defender desesperadamente é “quem está ainda contra é louco ou fanático”.

    Infelizmente, para a estupidez natural, ainda não foi inventada cura, de modo que iremos continuar a ouvir muitas vezes chamarem loucos e fanáticos aos que defendem a Língua portuguesa e estão contra esta aberração do AO90.

    De certo modo é bom sinal. é sinal que os seus defensores andam a ficar assustados com o tamanho do disparate em que se meteram. E agora… fuga em frente

    Até que isto há-de cair de podre, e este aborto ortográfico, mais tarde ou mais cedo será suspenso e revogado.

    Bem haja Vasco Graça Moura, homem de estatura intelectual e cívica como poucos neste país.

    Mais tem feito, como escritor, poeta e tradutor (vertendo para nossa língua obras fundamentais da literatura clássica, que de outro modo nos seriam inacessíveis em português) que toda a multidão de baratas tontas que se apressam a decretar o AO90.

  4. O “JC” refere-se a VGM como um «senhor é completamente louco e fanático.». O que chamaria JC aos autores de TODOS os pareceres qualificados contra o AO90 que foram ignorados pelos governantes portugueses? E, ao JPG, deixo esta sugestão: a hora do debate de ideias sobre o AO90 há muito que terminou. Os comentários favoráveis ao AO90 nesta página fazem tanta falta como uma gaita num funeral. Para propagandear o seu “bendito” AO90, devem os acordistas criar os seus próprios canais.

    • Jorge Teixeira on 17 Janeiro, 2013 at 14:37
    • Responder

    Os acordistas já estrebucham.

  5. Concordo, JRD.
    Esse JC, além de parvalhão e provocador, é analfabeto e mal-educado.
    Faltou-lhe a escola e faltou-lhe o berço. Azar.
    Isto não é uma casa de correcção.

  1. […] via «’O’ CPLP» [Vasco Graça Moura, "DN", 16.01.12] – ILC contra o Acordo Ortográ…. […]

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