«Liberdade de voto»

31 | I Série – Número: 085 | 17 de Maio de 2008

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como se compreenderá pela circunstância de, em representação do Grupo Parlamentar do CDS, haver duas intervenções não em sentido concordante, é óbvio que a nossa bancada tem liberdade de voto nesta matéria.

Queria defender aqui uma posição diferente da que foi assumida pelo meu colega de bancada Nuno Melo.

Hoje, estamos a falar sobre um acordo da língua portuguesa, e muito foi dito sobre a mesma.

A nossa língua foi a construtora da nossa independência. A língua portuguesa é uma referência da nossa identidade e, certamente, é também um valor da nossa soberania. Mas, acima de tudo, a língua portuguesa é o maior património que Portugal tem no mundo, não só do ponto de vista social, não só do ponto de vista político, mas, hoje, certamente também do ponto de vista económico. Essa é uma dimensão que não podemos esquecer.

Ouvi com muito agrado referências ao exemplo inglês.

O que acontece aos países que, como Portugal, não valorizam a tradição e o costume é terem sempre de se socorrer da lei e muitas vezes de acordos para estabelecer a língua.

O que tem de ser dito é que, ao contrário do exemplo inglês, em que há um dicionário de referência, o Dicionário de Oxford, que dita as normas da língua inglesa, em Portugal não existe um tal dicionário de referência da língua portuguesa. Mas, a existir, certamente não seria português e, porventura, seria brasileiro, pelo que manter-se-iam todas as questões relacionadas, por exemplo, com a utilização do gerúndio ou do trema. Por isso mesmo, olhando para uma língua que hoje é imposta por decreto e por convenção, o que temos de nos perguntar é se faz ou não sentido que essa língua seja comum a 250 milhões de lusófonos em todo o mundo.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Se é verdade que a língua portuguesa é nossa, não podemos esquecer que também é de uma comunidade de oito Estados, de uma comunidade formada por 250 milhões de pessoas espalhadas por todo o mundo.

É também verdade que a língua é um factor da nossa soberania, mas não esqueço o que o Professor Adriano Moreira referiu, num colóquio sobre esta matéria, organizado neste Parlamento. Disse ele que se a língua é um factor da nossa soberania, a verdade é que a soberania portuguesa não é dona da língua portuguesa.

Por isso mesmo, não podemos deixar de perguntar aos que, muitas vezes e hoje ainda, questionam este Acordo o que têm feito, por exemplo, para defender a língua portuguesa que é tão maltratada nas nossas escolas, no nosso sistema de ensino,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! Aí tem toda a razão!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … ou se não compreendem que, se não houver um acordo que una a grafia da língua portuguesa, ficará tremendamente dificultado o ensino do Português em todo o mundo.

Eu próprio, tal como muitos Sr.as e Srs. Deputados, assisti a um lancinante apelo de um português que está em Timor e que pedia que se ratificasse este Acordo Ortográfico para que possa ser uma realidade o ensino do Português em Timor Leste, com professores portugueses mas também brasileiros, ou angolanos, ou moçambicanos.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Se, há 500 anos, Portugal conseguiu tornar grande a língua portuguesa no mundo, foi porque soube abrirse [sic] ao exterior e soube que a sua fronteira não podia limitar-se ao continente.

Hoje, o que estão a pedir-nos muitos, os que estão contra o Acordo, é que voltemos a fechar a nossa fronteira e não tenhamos dimensão. Ora, Portugal só pode ser grande no mundo se, mais uma vez, estiver virado para o mar, virado para o Atlântico.

Aplausos de Deputados do CDS-PP.

Nota: na votação do Diploma, por parte do CDS-PP, abstiveram-se 3 deputados, 7 votaram a favor e 2 votaram contra.

[Extracto do “Diário das Sessões” da Assembleia da República de 17 de Maio de 2008, apreciação (e aprovação) do 2º Protocolo Modificativo do AO90, que deu origem à aprovação da R.A.R. 35/2008.]

[A transcrição acima confere rigorosamente com o original disponível na Internet, à excepção dos destaques a “bold”, dos sublinhados e das notas aos links, que são de nossa autoria.
Imagem de Wikipedia.]

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5 comentários

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    • Carlos Ponce on 1 Novembro, 2011 at 18:13
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    A verborreia quase ininteligível de alguns políticos tem aqui no Deputado Pedro Mota Soares um belo exemplo.
    Não fora a gravidade do assunto e até se poderia fazer a sugestão de aproveitamento da sua afirmação… “assisti a um lancinante apelo de um português que está em Timor e que pedia que se ratificasse este Acordo Ortográfico para que possa ser uma realidade o ensino do Português em Timor Leste” para tema de uma telenovela!
    Na realidade, TODOS os políticos que por cá pululam desde há cerca de 36 anos pouco se têm preocupado com aqueles que dizem representar, seus interesses em geral e mais têm andado ocupados nos “affairs” particulares em detrimento do resto.
    Só assim se compreende que nunca tenham colocado como prioritária a defesa da nossa cultura e naturalmente da nossa lingua em todos os territórios onde ela é falada e, inclusivamente, serviu de cimento aglutinador dos numerosos dialectos locais – casos de Angola e Moçambique, por exemplo.
    As «minudências» locais e as suas tiradas de grandes «tribunos» chegaram sempre para lhes aconchegar o ego.
    A Política Externa, onde a defesa intransigente da nossa cultura deveria ter um papel primordial, passou a estar sempre dependente de alegados pragmatismos que nada mais foram e são que desculpas para a posição em que desde então temos estado – de cócoras e ao serviço de terceiros!
    Também não seria de espantar outra atitude de um “Estado” que resolveu abandonar meio milhão de portugueses dos territórios sob administração portuguesa à sua sorte e sem o apoio merecido, muitos deles já na 2ª ou 3ª geração aí nascidos , e onde também não dignificou a sua imagem pelo abandono pura e simples daqueles que convocou e aí morreram na defesa do que então era considerado o solo pátrio e aí aínda se encontram enterrados.
    Quando Luis Vaz de Camões escreveu “Ditosa Pátria que tais filhos tens…” não fazia a certamente a mínima ideia daquilo em que se transformaria a Pátria de que falava nem da evolução pela negativa que os ditos filhos iriam sofrer…

  1. A soberania portuguesa carreou o idioma a onde a impusemos. Foi isso que o prof. Adriano Moreira disse: o idioma é um factor (sublinho factor) de soberania. E esta luminária diz que a soberania portuguesa não é «dona» do idioma. Com raciocínio destes não admira que seja a soberania brasileira a ditar o idioma a este deputado da República Portuguesa.
    O caso nem era difícil. Emana de quem a soberania? E que idioma fala o soberano povo português? Timorense? Brasileiro? Mas vá lá o bestunto destas bestas entender…
    Cumpts.

  2. Quem é que votou contra?

  3. Eles estão lá por causa da língua, que está implícita ao espaço – por muito latim que nos tenham enfiado. Ou criolo brasileiro. Ou o que eles quiserem. E já agora – deviam ter ouvido o ‘entitulado’ velho do restelo. Estamos na choça. Outra vez. De facto, ‘choça’ mantém-se.

    A volatilidade do pensamento atingiú um estatuto obrigatório em Portugal – maior do que ser fan do Tony C, ao nível de ser quase obrigado a ter uma conta no dejecto do facebook.

    P:Onde anda a manifestação criativa e individual?

    R:Anda é tudo atrás da mama. (sem til)

    • Raquel Pedrosa on 14 Dezembro, 2011 at 16:37
    • Responder

    Este homem está no partido errado… Este e os outros 6 que votaram a favor.

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