Reescrever a História [I]

«Proposto pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma tentativa de unificar a língua portuguesa, sobretudo na internet, o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa passa a ser obrigatório no Brasil a partir de 1º de janeiro de 2013.»
“Jornal da Manhã” (online), Uberaba (Minas Gerais), Brasil, 19 de Março de 2012

Uma das consequências do AO90 que mais têm sido escamoteadas e que os nossos políticos, por regra, fingem ignorar é a seguinte: à conta de uma pretensa (e impossível) “uniformização” da Língua Portuguesa, a norma-padrão do Português está a ser inexorável e sistematicamente apagada em todos os registos e em qualquer suporte. Na Internet (e não só), dezenas, centenas, milhares de pessoas – na sua maioria do Brasil mas também contando com a solícita colaboração de alguns portugueses – estão a simplesmente fazer desaparecer a norma ortográfica do chamado Português europeu, como se tal coisa nunca tivesse sequer existido.

As provas que evidenciam esta gigantesca operação de genocídio linguístico (e cultural, por inerência) estão por todo o lado, apesar de também sobre elas, as provas, além dos conteúdos propriamente ditos, incidir a sanha, a raiva e o labor frenético destes revisores da História que agora se afadigam em sumamente liquidar o passado (que nunca o será para nós outros) da Língua Portuguesa.

Abreviando razões, aquilo que se está a passar é que a mentira da “língua portuguesa unificada” tenta instaurar a sua política do facto consumado através da eliminação pura e simples de qualquer referência ou conteúdo que não “obedeça” ao “acordo ortográfico” de 1990. Ou seja, em suma, segundo eles nunca antes houve norma-padrão, apague-se tudo aquilo que existir, sempre houve a “nova norma”, substitua-se a “antiga” por esta.

Nesta série de artigos, de que hoje se publica o primeiro, tentaremos ilustrar com exemplos vários – todos eles fundamentados documentalmente – este fenómeno que tem passado (deliberada e orquestradamente) despercebido da opinião pública e que poderíamos talvez designar pela abreviatura “PAEC”, processo de aniquilamento em curso.

A ilustração que se segue mostra, sem necessidade de quaisquer comentários adicionais, a forma ditatorial, canina, verdadeiramente nazi como esta “nova ordem ortográfica” é imposta, no caso, aos utilizadores da Wikipedia que se diz “lusófona”. Relevem-se, caridosa e pacientemente, as óbvias dificuldades de redacção do “Vinicius” em causa:

«Aproveito para lembrar que, apesar da Wikipedia lusófona privilegiar o uso das normas do Acordo Ortográfico de 1990 nas suas páginas oficiais (políticas, recomendações, etc.), qualquer usuário é livre de utilizar nas suas edições as regras ainda vigentes no Brasil (Formulário Ortográfico de 1943) ou as dos restantes países lusófonos (Acordo Ortográfico de 1945), não sendo toleradas alterações de uma norma para outra

No próximo artigo desta série veremos de que forma NUNCA EXISTIRAM na Wikipedia “lusófona” algumas entradas (palavras) com a grafia do Português-padrão.

[Imagem de topo de Tate online.]

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9 comentários

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  1. É verdadeiramente assustador e o povinho nacional, como de costume, come e cala; até porque a infeliz realidade é que a maioria já escreve tão mal que, na verdade, este acordo é uma verdadeira concessão à ignorância e carta-branca a todo o pontapé na nossa bela língua.

  2. Isto deve chegar ao Público e ao Correio da Manhã!
    “Na Internet (e não só), dezenas, centenas, milhares de pessoas – na sua maioria do Brasil mas também contando com a solícita colaboração de alguns portugueses – estão a simplesmente fazer desaparecer a norma ortográfica do chamado Português europeu, como se tal coisa nunca tivesse sequer existido.

    As provas que evidenciam esta gigantesca operação de genocídio linguístico (e cultural, por inerência) estão por todo o lado, apesar de também sobre elas, as provas, além dos conteúdos propriamente ditos, incidir a sanha, a raiva e o labor frenético destes revisores da História que agora se afadigam em sumamente liquidar o passado”

    • Luís Ferreira on 25 Março, 2012 at 7:44
    • Responder

    Resta-me dizer:

    Obrigado, Prof. Cavaco. És um génio!

  3. De feito, não lidamos com gente séria. Mais um passo e foi Portugal que nunca existiu.
    Cumpts.

    • Alexandra Silva on 25 Março, 2012 at 21:38
    • Responder

    Vendo pela prespectiva dos politicos, ate tem logica, embora eu nao saiba que ganham eles com isso! Mas vendo bem, eu propria como portuguesa, originalmente da ilha da Madeira, aprendi a ler e escrever a lingua portuguesa como deve de ser! Porque razao vem eles agora com essa brilhante ideia de querer destruir, e aniquilar completamente a nossa lingua? Vendo bem, se voltar a residir na Madeira, terei que aprender de novo a ler e escrever o portugues que eles nos querem impor a forca? Nessa altura acho que ja sera um pouco tarde pra eu frequentar a escola primaria nao? De qualquer forma, recuso-me a aceitar este acordo, e muito menos a utiliza-lo! Facam o que fizerem, continuarei a usar portugues de Portugal, e nao uma correccao rasca que me querem exigir!!! E antes que me esqueca, aceitem meu pedido de desculpas pela falta de gramatica na minha escrita, mas uma vez que resido no estrangeiro o meu portatil nao inclui certas pontuacoes necessarias!!!! Nao ao acordo ortografico!!!!!!

    • Luís Ferreira on 25 Março, 2012 at 23:00
    • Responder

    @ Alexandra Silva

    Não basta gritar – e bem – “Não ao acordo ortografico!!!!!!”. É preciso assinar a ILC e procurar que outros a assinem. Sem umas (muitas) dezenas de milhar de assinaturas para chapar na cara dos nossos políticos, este escorregar para o abismo não é travado.

    • Manuel de Sousa on 27 Março, 2012 at 21:17
    • Responder

    Ninguém na Wikipédia está empenhado em apagar registos, nem os sobre as regras do Acordo Ortográfico de 1945, nem quaisquer outros. Afirmar isso é desconhecer em absoluto os princípios que presidem a esta grande iniciativa de trabalho colaborativo que é a Wikipédia. Sendo a Wikipédia escrita por lusófonos de vários países, tem como regra comummente aceite que se um editor usar a norma portuguesa para redigir um artigo, este não possa ser alterado para a brasileira por outro editor e vice-versa. Não entendo como pode chocar esta regra de boa convivência da Wikipédia.

    1. Isso é mentira I.

  4. Recordo também a todos os defensores do ‘acordo’, que um dos vossos maiores ídolos era completamente contra o ‘acordo’, considerando-o um absurdo, e no youtube existem vídeos que ele explica o porquê do absurdo, que curiosamente: é idêntico ao pensamento de Orwell.

    José Saramago era expressamente contra o acordo ortográfico.

    Estão portanto, muitos de vocês que apoiam o acordo, contra as idéias de um dos vossos grandes ídolos. Reflictam.

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